Estou há horas sentada frente ao computador esperando que de alguma forma as
palavras certas brotem de mim e se espalhem pela tela. O café já esfriou; a música já
parou. O sol já se pôs e as nuvens pesadas que traziam chuva já se foram, mas eu ainda
não consigo preencher o vazio que se abriu aqui dentro desde que nos fomos.
A vida segue seu rumo, mas agora o ritmo é outro. Como numa dessas canções
traduzidas em que algumas estrofes nos parecem erradas ou desconexas por
conhecermos a versão original, assim estão os meus passos. Cada novo caminho me leva
de volta a você, e nada ao meu redor parece aceitar minha versão solo.
Onde foi que erramos? O que aconteceu com a gente?
Lembro-me perfeitamente dos meus erros, e por ironia agora sei exatamente como agir.
Mas o tempo é forte aliado do ir, e nunca do voltar. A areia fina que cai do lado de dentro
da ampulheta não cairá novamente no mesmo ponto que caiu antes. Da mesma forma,
os segundos vão passando lentamente, mas nem por isso deixam de passar.
Basta uma rápida olhada em meu baú de memórias para eu saber por que fui, mas é
claro que junto a isso vem às lágrimas por saber que não queria ter ido. Afinal, ir para
onde se foi no teu abraço que eu me enraizei? Fugir de quem se em silêncio ainda
suspiro teu nome?
Os outros são divertidos, mas tão meninos. Tão gentis, mas tão sarcásticos. Tão falantes,
e tão sem assunto. Eu não imaginava um dia me lembrar de você como alguém que se
foi. Eu não pensei que seria eu a garota a partir.
Os dias continuam lindos, e o ipê em flor me faz pensar em suas histórias. Eu falo sobre
liberdade, discurso para todo um auditório. Faço as pessoas ao meu redor rirem, e no
fim do dia, durmo pensando sobre como deve ter sido sua vida nessa porção de horas
em que eu vivi e sobrevivi.
Dirijo ouvindo uma música qualquer, e se não me percebo, saio acelerando mundo a
fora, como quem procura por algo que não sabe ao certo o que é. Torço com todas
forças para que esteja tudo bem na sua vida, e entro em guerra comigo mesma ao
desejar profundo que seu mundo esteja desmoronando com a minha falta.
Você foi a prova de que existe amor aqui dentro, por isso tanto apreço.
Eu caminho sem olhar para trás, seja nas vias da cidade ou nas da vida, por isso, não se
importe com meu desdém ao seu silêncio. Aprendi a tocar minha própria música, assim,
nenhuma falta de melodia me perturba. Mas isso não significa que em cada passo eu
me distancie mais.
Tomei o espaço necessário à nossa sanidade mental, mas isso custou cada milímetro do
meu coração. Por isso – e só por isso – eu desejo que você esteja bem, porque a minha
cura vai levar mais um bocado de cafés doces.
À sua maneira sei que estou cravada na memória feito entalhe na madeira, e isso me
traz conforto suficiente para continuar, mesmo sem saber para onde vou. Foi tão pouco
tempo, mas surtiu efeito por toda uma existência, e eu não sei dizer ao certo quantas
vidas isso dá.
Aqui, sentada, vendo a força da noite, é fácil visualizar seus olhos escuros e a
tempestade que há dentro deles. Era lindo o encontro entre as suas nuvens e a
imensidão do meu mar; foi singular.
Espero que, assim como um girassol, sua vida encontre todos os dias um motivo para se
abrir, e que se possível, você se lembre de mim com ternura. Onde quer que eu esteja,
vou rir das suas manias, e de minha aleatoriedade de assuntos. Algumas coisas,
independentes do tempo, nunca mudam; você na minha vida é uma delas.
Não permita que nada te pare, nem tenha medo da vida; dê seus passos de cabeça
erguida, sem pensar demais no porvir. Se precisar, segure minha mão. Não importam
nossa distância nem tempo perdido; esteja eu longe ou perto, não vou te deixar cair.
(Imagem: Bruno Maceiras)