Quem me segue nas redes sociais sabe que estou acostumada a falar sobre amor-próprio, mas hoje venho falar também sobre o amor, mas o amor ao outro.
Eu tenho certeza que você assim como eu já vivenciou muitas paixões, daquelas arrebatadoras, que lhe tiram do prumo, que lhe entorpecem os sentidos e lhe trazem de súbito a sensação de “e agora? Perdi o controle!”
Pois saiba que comigo não é diferente, mesmo após tantos anos de busca constante por desenvolver uma autoestima tão estável, daquela que não se deixa abalar pelo mínimo sinal de paixão, qualquer envolvimento maior era avaliado entre o “vale a pena” ou “não vale a pena”, e inevitavelmente eu ficava com a segunda opção.
Até que a vida me pregou uma peça, a vida sempre desafia a minha capacidade de ter fé, de demonstrar coragem. Me vi completamente imersa em um relacionamento. Pasmem. E olha, sinto até um pouco de vergonha ao dividir com vocês esse sentimento. Acho que é por isso que prego tanto que devemos ter cuidado com o que pedimos ao universo, ele costuma mandar sob medida.
E eu pedi alguém como ele. Não podia ser cético, tinha que acreditar em energia e compartilhar gentilezas. Ah, era bom que tivesse filhos e relacionamentos anteriores, e que esses filhos e esses relacionamentos tivessem marcas profundas, para que ele reconhecesse o que de mais dolorido podemos vivenciar quando estamos com alguém.
E tinha que saber se comportar em qualquer local: numa mesa bem posta, numa conversa de bar, entre quatro paredes, no restaurante, na balada, na escolha do vinho, no modo de servir, nos gestos. Ah, também tinha que me fazer bem na cama, de um modo que eu sentisse vontade de satisfazer todas as suas vontades, cada vez que ele suspirava era dentro de mim que pulsaria o maior dos prazeres. E teria que me deixar dormir em seu ombro, de conchinha, dentro de um abraço. Bonito, inteligente, com português impecável, claro que pequenos errinhos de gramática seriam bem-vindos, como uma licença poética. Tem mais: as mensagens de WhatsApp tinham que vir cheias de carinhas com corações, flores, como que preparando para a ligação apaixonada.
Tenho a certeza que eu soube enumerar tão bem as características de quem eu desejava encontrar, com tantos detalhes, que não teve como errar: o reconheci no primeiro instante, também no segundo, no terceiro.
Eu só não previ um detalhe: as características de alguém assim melindram uma característica ainda maior, demonstram o perfil de alguém intenso demais. Uma pessoa tão intensa, que se arrisca, que se joga, que se defronta… que não percebe que o amor é delicado, que é necessário uma forte dose de discernimento para lidar com ele.
Digo isso pois as situações conflitantes aparecem e com elas vem o medo. Pois aquele amor chegou onde já havia história, haviam planos, objetivos e para alguém tão centrado, tão exigente com seus objetivos, tão centrado em alcançar metas que para muitos parecem inatingíveis… o amor aparece como empecilho.
O amor, mas posso falar sobre o seu efeito mais próximo: a paixão. A paixão ela produz insônia, calafrios, ansiedade, calores e uma pressa, a pressa de estar na presença do outro, de estar encostada no outro, como se a paz aparecesse desse repente, da presença.
Mas aí chegam os problemas do dia a dia, a rotina, os filhos, as ex, os ex, as contas, as tarefas, os estudos, a intempestividade da rotina. E aqueles planos, aqueles sonhos, aquelas planilhas tão bem redigidas, tão rígidas, tão infalíveis, parecem ser colocadas em risco pela falta do outro, sim esse outro que você acabou de conhecer, que lhe tira de dentro dos afazeres, que lhe rouba a atenção, que suplica pelos encontros furtuitos no meio da tarde, que lhe faz sorrir para o nada.
Assim começa a confusão. Você estava bem até o momento em que o tal universo resolve lhe presentear com a pessoa que você sempre quis, e resolve lhe apresentar essa pessoa bem no momento em que você estava com a casa arrumada, com a cabeça no lugar, com os espaços delimitados, quando você queria tudo, menos acordar para a fúria que é uma paixão quando a deixamos habitar em nós.
E então, o que fazer? Culpar o universo pela bagunça que causou? Devolver o presente? Virar as costas? Jogar pra cima? Esquivar-se?
Mas, e se depois de sofrer com toda essa avalanche de pesares, dúvidas e incertezas nós simplesmente relaxarmos? O que você faz quando uma onda forte do mar se aproxima e tenta lhe pegar de surpresa? Consegue correr ou você simplesmente mergulha dentro dela com olhos e respiração trancados?
Eu posso estar errada por tentar ver um presente do universo como algo bom? Será que posso estar errada ao agradecer por ter sido contemplada com o amor que sempre esperei?
O que fazer?
Talvez nesse pedido ao universo, tenha me esquecido de acrescentar esse item fundamental: preciso que essa pessoa caiba nos meus sonhos, que respeite os meus planos, que abrace as minhas causas, que seja tolerante, compreensível com as minhas fragilidades e que tenha fé, que tenha a coragem de acreditar que merece ser amado, que merece ter alguém que some ao seu lado, nem que para isso tenha que ficar dias sem dormir, alguns dias com a planilha atrasada, tudo em nome do amor. E não é o amor que faz a vida valer a pena?
Dizem que amor é a soma de paixão com amizade. Tenho para mim que essas oportunidades que a vida nos impõe necessitam ser exploradas. É óbvio que não sou mais nenhuma menina, a maturidade me faz voar, sabendo o local e a hora de colocar os pés no chão. Nesse momento a paixão deve dar lugar à amizade, e se fazer respeitar, saber que somos únicos e precisamos de momentos individuais, que os objetivos para serem alcançados necessitam de atenção, de caminhar. Você caminha ali, eu aqui, com o nosso objetivo à frente, nem sempre de mãos dadas, mas juntos.
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