Sinto uma necessidade teimosa de olhar para dentro.

De relacionamentos rasos o mundo está cheio. E não tem nada demais nisso não. Não podemos esperar que todo contato que temos seja profundo, que vizinhos se tornem amigos do peito, que passantes na rua sejam mais que isso, que colegas de trabalho sejam também colegas de vida… É assim mesmo. A maioria de nossos contatos é rasa e isso é normal.

Portanto, não estou escrevendo para criticar os relacionamentos rasos, não, não é isso. Eles estão aí, fazem parte e são até necessários. O problema é que já tenho muitos, na verdade, demais! A coisa anda inflacionada, com muita gente só passando, só olhando de longe, só botando a ponta do dedo para não molhar a mão.

É excesso de gente que fica só na superfície, que pergunta sem querer mesmo saber, gente que só transita, sem real interesse em parar para se conhecer melhor, deixando a impressão de que quer ouvir, mas sem escutar, que quer ver, mas sem enxergar, pensar sem refletir, comer sem degustar, dormir sem sonhar e existir sem realmente viver.

O problema é que tem tanta gente querendo só a casca que já não tenho mais casca para dar! Francamente, minha casca acabou! Então, se você deseja relacionamentos rasos, tudo bem, busque-os, é um direito seu, mas eu não posso lhe ajudar, já que estou quase totalmente descascado! Do pouquinho de casca que ainda resta eu preciso para meus contatos rasos inevitáveis.

Agora, se você tiver buscando um contato verdadeiro, se você não tiver medo de nadar em águas profundas, se você não quer só tirar uma lasca da casca, mas ver o que tem no miolo, então sim, aí podemos conversar. Aqui tenho interesse!

Se você, como eu, também sentir essa necessidade teimosa de olhar para dentro, se para você uma lágrima sincera também é muito mais gratificante que qualquer sorriso fingido, se você também prefere a verdade amarga a qualquer doce ilusão, somos então farinha do mesmo saco, madeira da mesma árvore, raios da mesma luz. E gente assim pode chegar sempre!

Mas sabe o que não adianta? Não adianta ser raso e querer se passar por profundo. Profundidade não se finge. Pode até tentar, mas não funciona, pois o que é raso é oco e flutua sempre na superfície. Você pode puxar para baixo, mas o que é raso não fica, emerge e volta para cima, onde é seu lugar. Então, lhe peço: se não for com profundidade autêntica e verdadeira, nem precisa chegar perto.

Fique lá em suas rasuras e me deixe quieto por cá. De nada vai adiantar, por exemplo, se você chegar perguntando como eu estou, mas sem querer realmente saber, pois eu vou responder com franqueza e você vai arrumar uma desculpa para não escutar, deixando cair a máscara do raso desinteressado que tenta se passar por profundo.

Então, bem-vindos aqueles que buscam um contato profundo! E os rasos que me desculpem, mas não posso. Relacionamentos rasos já tenho bastante.

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Blogueiro residente em Berlim. Apaixonado por palavras, viciado em escrever, sem luvas, tocando no assunto, porque gosta e porque precisa, sobre a vida e tudo que a toca. É colunista do site Fãs da Psicanálise.

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