Nunca tivemos tanta facilidade de comunicação e ao mesmo tempo tanto isolamento social. Ou será que é justamente o mundo da tecnologia e da crescente expansão dos meios de comunicação que estão produzindo indivíduos mais solitários?
Fato é que podemos constatar que a vida moderna aguça este estado de um vazio indefinido e os(as) psicólogos(as) têm percebido isto. Na clínica, cada vez mais, ouvimos perguntas do tipo:
• Como identificar se sou independente, individualista ou solitário?
• É normal ter várias pessoas ao meu lado e sentir como se não tivesse ninguém?
• Amo minha família e amigos, mas mesmo assim, me sinto só, por quê?
• É verdade que quanto mais bem sucedido for um indivíduo na profissão mais ele se sente sozinho?
• Por que não consigo confiar de fato nas pessoas?
• A culpa de me sentir carente é minha ou deste mundo atordoado em que vivemos? Como saber se minha carência está me prejudicando?
• Sinto bem quando fico só, gostaria de ter mais momentos para mim, isto é bom?
• Todos com quem me envolvo me decepcionam, isso é azar ou eu atraio estas pessoas?
As queixas das pessoas que chegam ao consultório psicológico com esta demanda são variadas, vai desde irritabilidade excessiva, mudanças bruscas de humor, baixa autoestima, insegurança, impaciência, falta de tolerância na convivência, passividade, sentimento de culpa e/ou fracasso… até queixas de temor da traição, de ciúmes, da tentativa de exercer o controle da relação, de se sentir desprotegido e vulnerável perante os outros, dentre outras.
Mas por que será que as pessoas se sentem sozinhas? São vários os fatores, alguns exemplos são: falta de tempo para a vida social; competição em ambientes de trabalho e na própria família; desconfiança sobre a intencionalidade da aproximação: “não sei o que ele quer de mim”; medo de se comprometer; de ser rejeitado; a incansável busca pelo parceiro “ideal” e, ao mesmo tempo, facilidades de se entreter com o mundo virtual ou com atividades que não necessitem de companhia.
Freud foi quem primeiro construiu uma teoria defendendo a ideia de que o relacionamento com os outros é a maior causa de sofrimento do homem. Ele dizia que o mal-estar na civilização é o mal-estar dos laços sociais. Os pós-freudianos concordam que a dificuldade em se relacionar é um dos mais graves problemas que desafiam a cultura da vida em sociedade. Bassols através do trabalho clínico com crianças, define a solidão como um estado de humor, um feeling ou um afeto, na maioria das vezes, ligado à angústia frente à constatação de que somos sujeitos da falta.
A psicanálise encara a solidão como afeto inato e ate necessário ao processo de subjetivação dos sujeitos. Entretanto, isto não significa que o isolamento social seja saudável ou que não devemos buscar a melhoria no modo como nos relacionamos. É comum ouvirmos que a solidão é um sintoma cultural da pós-modernidade, porém Lacan não concorda com esta afirmação, pois o sintoma psicanalítico é favorecedor de vínculo social e a solidão faz o movimento contrário.
O sujeito da psicanálise desde sua origem é referido ao outro, pois o nosso desejo é interpretado por outras pessoas. Para ilustrar, quando o bebê chora é sua mãe (ou sua cuidadora) quem interpreta: “ah, esse choro é de sono, esse é de fome…” E assim vamos crescendo através dos olhares dos outros. A estruturação do desejo se dá através da estruturação dos laços afetivos com o outro, em que as necessidades do sujeito se transformam em demanda de que o outro o ame. Esta demanda de amor é inesgotável e, portanto, impossível de ser atendida/satisfeita. É então, que se instaura no sujeito o chamado “vazio constitutivo”, ou seja, o desejo sempre insatisfeito e, é justamente este que move a vida.
Então, qual a contribuição da análise já que o sentimento de solidão faz parte do ser humano? O processo analítico é uma oportunidade de fortalecimento e desenvolvimento dos recursos interiores. Com isto, é possível pensarmos em um “amadurecimento emocional”, o que certamente, irá possibilitar uma significativa melhoria nas relações sociais, minimizando assim, a sensação da solidão. Dito na linguagem psicanalítica é a possibilidade de o desejo, o motor da vida e promotor dos laços sociais, realizar uma transformação no sentido de favorecer a alteridade e, ao mesmo tempo, retirar o sujeito desta exaltação do Eu.
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