Amor

Sintonia, conexão e intimidade nunca serão questão de tempo, mas sim de pessoa

Quem nunca conheceu uma pessoa e se pegou pensando que talvez em outro momento ou em outro plano já haviam se conhecido, que atire a primeira pedra.

É incrível a força do bendito e desconhecido fator que nos faz sentir uma descarga elétrica de emoções correndo pelas veias apenas pelo desenrolar fácil de uma conversa.

Há quem diga que o tempo constrói e solidifica as relações, mas não posso me sustentar apenas a isto pra falar de amor. Se o passar dos dias aumentasse ou diminuísse a quantidade de cola que une corações não veríamos casamentos sendo destruídos após 37 anos de convivência, e não conheceríamos casais que ficaram noivos na semana em que começaram a namorar.

O tempo é uma variável linda e necessária, mas o passar dos minutos não é capaz de transformar um simples café na melhor experiência já vivida, e também não é ele o responsável por tornar nossos pequenos intervalos em uma saudade gostosa, dessas que bate no sábado à tarde e a gente se permite apanhar.

O Japão nos apresentou sua lenda do fio vermelho que conecta duas pessoas, e vez ou outra, quando ouço mais uma dessas longas e até mesmo malucas histórias de amor, considero que afinal, faz algum sentido o tal fio. Talvez ele seja apenas uma lenda mesmo, mas sem sombra de dúvida há algo capaz de unir destinos e propósitos até que eles se cruzem e percebam que ali, naquele abraço, é possível descansar.

Tem gente que fica ao nosso lado por anos, constrói uma história repleta de risos e sorrisos, contribui com nosso crescimento, e em algum momento se vai, como a fumaça de um palito de fósforo após ser apagado. E de repente chega outro alguém, assim, de sopetão, abre a porta e vai entrando, e sem precisar de licença ou experiência comprovada, toma um espaço que parece até sempre ter lhe pertencido.

É estranho pensar que às vezes não conseguimos expor nossa parte mais íntima e profunda para alguém que nos acompanha há um longo período de tempo, mas tagarelamos sobre nossas fragilidades com quem acabou de chegar. Quando nos sentimos conectados a uma pessoa, é impossível não se sentir à vontade. Seja em pé ou sentado, dirigindo ou deitado, a todo instante é hora de ser exatamente quem somos, com nossas forças e fraquezas sendo expostas em frases e atitudes.

É como se o mundo – naquele instante – passasse a ter uma nova forma, onde agora é possível, pela primeira vez experimentar a sensação de respirar embaixo d’água, ou de caminhar no solo da lua sem precisar flutuar para fazer isso.

Inexplicavelmente você reconhece os trejeitos e decora cada um dos olhares, e até a forma como a pessoa ri lhe é familiar, porque então, em meio à uma multidão de pessoas, você deu a sorte de esbarrar naquela que tem a bendita química, mas não é apenas um excesso de substâncias liberadas pelo organismo na tentativa de diminuir os efeitos naturais ocasionados pelos sentimentos, e sim uma conexão que transpassa os limites físicos e atinge os níveis emocionais, mentais e em casos mais extremos, até os espirituais.

O afeto em torno dessa pessoa é mais profundo, pois ele não se limita apenas ao carnal, mas dá espaço também para um carinho de família e um cuidado de amigo, porque o seu coração encontrou uma casa, e é ali que pretende morar. Talvez ele more alguns dias, talvez meses, quem sabe a sorte lhe bate à porta e permite alguns anos, mas independente da quantidade de horas divididas, o resultado é sempre o mesmo: você feliz, e certo da escolha feita.

Nunca é tempo. Nem mesmo a soma de todos os segundos trabalhados por cada um dos relógios de todo o mundo seria capaz de atingir o alto grau de intimidade criada naturalmente entre duas pessoas que dividem o mesmo coração. Não há minutos suficientes para se aguardar pela chegada de uma pessoa que altera toda a história da outra, apenas por existir.

Nunca foi tempo. É ótimo ter quem nos acompanhe todos os dias por anos e anos, mas isso não nos garante felicidade, e muito menos conexão. Há quem tenha experimentado mais emoções em 4 dias de romance que em 40 anos de matrimônio, e não há nada de errado nisso.

Nunca será tempo, porque o passar dos dias consegue criar nós e emenda-los até que eles se transformem numa rede capaz de nos prender a uma pessoa ou situação, mas o que nos mantem junto a alguém – mesmo com a opção de estar separados – é laço, e laço é construído à mão, cuidadosamente, por quem deseja o fazer assim, ao contrário do nó, que é de momento, feito para prender, e não para adornar.

A construção de uma história de amor depende de entrega, e isso depende totalmente do quão bem nos sentimos com alguém. Um minuto pode ser o fim do mundo ou o começo de uma vida, o fator determinante dessa equação é o nosso querer, e não a soma de horas passadas juntos.

Sempre que for preciso fazer um balanço do seu coração, pense em que casa ele se assenta assim que chega. De quem é o olhar que ele decorou, e em que sorriso encontrou paz. Quais conversas são infindáveis em suas curtas e enormes respostas, e quem consegue lhe fazer rir mesmo quando as coisas não vão bem. Parece difícil, mas a verdade é que as respostas que precisamos estão dentro de nós, esperando ser ouvidas.

Basta olhar atentamente para dentro de si e você vai se encontrar consigo mesmo, exatamente no lugar onde seus pensamentos pararam. Ali, nesse lugarzinho por onde você já passou, vai estar também a alma que se conectou à sua em dada hora de determinada data, mas que independente do horário, marcou.

Raquel Gonçalves

Há quem diga que os olhos são a janela da alma, então, no meu caso, eles são uma janela bem grande e aberta. Amante das artes, do universo e das palavras, necessito de música para viver, dos astros e estrelas para pulsar e dos versos para existir. A publicidade me escolheu; por isso anuncio paz, promovo sorrisos e transmito intensidade. Sou colunista do Fãs da Psicanálise.

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