O que faz as coisas darem errado? Muitos podem responder: as coisas dão errado quando não saem conforme os planos; ou as coisas dão errado quando alguém me decepciona. Se você pensou algo por aí, saiba que isso é um sinal de que é alguém que busca controlar as coisas. Algo muito natural, mas causador de muito sofrimento. Vamos entender isso melhor.

Como seres pensantes, é muito natural que tenhamos os fatos da nossa vida pré-moldados em nossos pensamentos. Por exemplo, quando saio de casa, imagino que, apesar do trânsito, chegarei bem no trabalho, sem contratempos ou sem grandes alegrias. Quando saio com determinada pessoa, já sei mais ou menos o que esperar dela enquanto companhia. Mas a vida é sempre muito mais rica do que um script imaginário. Sempre outras coisas acontecem.

Posso, por exemplo, encontrar a pista mais livre do que o esperado para um dia útil de manhã, ou no caminho para o trabalho posso ouvir no rádio uma música que me traz lembranças muito alegres da época da infância. Ou, ao sair com uma pessoa, ela pode me surpreender com uma conversa mais interessante do que eu imaginava. Quando as surpresas da vida nos são favoráveis, evidente muito bem-vindas. As coisas saem “melhor que o planejado”. Porém, quando as surpresas nos são desagradáveis…

Quando o trânsito está mais lento do que o normal certamente isso pode vir a me aborrecer ou me angustiar. Não era esperado esse atraso, e nem confortável vivenciá-lo. Ou quando a pessoa que sai comigo, ao invés de se mostrar como eu esperava, está triste, chateada, ou pior, descontando tudo em mim?! Certamente não era o que eu queria quando aceitei a companhia dela. Isso me irrita, me tira o ânimo. Essa reação emocional acontece porque eu simplesmente não gostaria que estivesse sendo assim. Isso é muito natural.

Entretanto, essa postura muito humana traz consequência e dores também muito humanas. Posso eu viver uma vida inteira repleta de uma sensação de peso por não conseguir lidar bem com nada de inesperado que me venha. Tenho muito dificuldade de aceitar as coisas como se apresentam para mim.

Não aceito o jeito do outro, as surpresas do trânsito, o cenário político, meu contexto profissional, etc. Posso (e devo) lutar por tudo que quero que seja diferente, mas existem coisas contra as quais não se pode lutar. Como eu poderia sair de meu carro e fazer o trânsito andar mais rápido? Ou fazer com que a pessoa com quem estou seja mais amistosa? A aceitação dessas coisas é a chave para uma vida mais leve.

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Por que não aceitar a forma como a outra pessoa é, quando ela não sabe ser diferente? Por que carregar o peso da raiva contra alguém do meu trabalho, quando a postura desse alguém não me atrapalha efetivamente em minhas tarefas? Como não deixar que os planos mudem, quando os meus amigos querem sair para um lugar diferente dessa vez?

Para quê não permitir que meus filhos tomem certas decisões, já que eles já estão mais velhos? Infinitas indagações poderiam ser feitas aqui. Não há uma resposta certa. Existem perguntas, e só você pode responder. Existem pesos e preocupações que, definitivamente, não precisam ser carregadas nos pensamentos e nas emoções.

Quando abro mão do excesso de controle, a vida começa a andar mais. Pode doer um pouco, pode demandar algum esforço, mas será sempre mais leve. Não há nenhum peso nos ombros quando aprendo a fazer esse discernimento. Dar menos importância para o controle das situações significa mais liberdade para escolher e construir minha própria história. Mais liberdade para prosseguir. Mais liberdade para sorrir.

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Psicólogo, reside no Rio de Janeiro e é colunista do site Fãs da Psicanálise.

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