Quero falar da esfregação, esse ato sócio-erótico que serviu para aproximar pessoas durante muitas gerações, que quase desapareceu com a chegada da internet, mas que hoje está voltando, mesmo que de uma forma bastante diferente e mesmo que não dê mais certo como dava antigamente.
Vamos ser sinceros: não era se esfregando que a gente se conhecia? Não era no “rala-bucho”, dançando forró, lambada, gafieira, salsa, merengue e tantas outras danças que bem servem para isso?
Mesmo na valsa não tinha gente que dava um jeito de dar uma esfregada e até em música eletrônica, com todo mundo dançando solto, não era especial aquele momento em que o rapaz bonitinho ou a moça bonitinha passava raspando em você e lhe tocava de alguma maneira?
Já na idade média, com aquelas danças cheias de figuras e formalidades, os casais sempre davam um jeito de se esfregar, pelo menos é o que mostram os filmes de Roliúde.
Até em ambientes mais sérios, como no trabalho, também rolava esfregação. Colegas se gostavam, mas não tinham coragem de se aproximar diretamente e iam deixando acontecer, com trocas de olhares, toques “acidentais” durante o expediente e esfrego de ombros ao passar no corredor apertado.
As pessoas se conheciam também através do toque, do contato corporal, da aproximação física (direta ou sutil).
Em minha opinião, a esfregação era bastante útil nessa fase inicial, de aproximação de um casal. Era através das esfregadelas que se ia percebendo se valia a pena arriscar esfregadas maiores.
Só que essa “esfregação preliminar” quase desapareceu do mapa. O povo começou a ralar menos o bucho nas pistas de dança, preferindo buscar parceiros pela internet, o que não deixa de ser uma coisa muito útil, pois permite esclarecer muitas coisas já de antemão, desde as preferências até a foto nude para se certificar que não se está comprando gato por lebre.
Todavia, depois de esclarecer tudo que pode ser esclarecido virtualmente, o casal se encontra e, o mais tardar quando começa a esfregação, se percebe que não dá para esfregar direito esse encontro.
Mas o povo é esperto e resolveu então “reinventar” a esfregação, só que hoje ninguém mais mexe as cadeiras para isso. Na verdade, nem precisa sair de casa. Basta sentar-se no sofá (ou mesmo no vaso sanitário) com o telefone, esticar o dedo indicador e sair esfregando fotos para um lado ou para o outro.
Acredito que já deve ser possível determinar o grau de solidão de uma pessoa pela “grossura” dos músculos de seu dedo indicador, que deve ser bem mais acentuada em esfregadores frequentes.
O povo sai então esfregando a torto e a direito, para lá ou para cá, até que dois usuários se esfregam mutuamente. O esfregão digital aproxima os dois, mas, na hora de se esfregar de verdade, percebe-se que os problemas persistem e a coisa termina em osso batendo em joelho, muito ai, ai, ai, ui, ui, ui e outros pequenos acidentes de dois seres com ritmos de esfregação inteiramente incompatíveis. Como eles saltaram a “esfregação preliminar”, eles puderam constatar anteriormente muitas coisas, mas não se a química realmente batia.
Sei não, podem me chamar de antiquado, de cafona, de quadrado, do que quiser, mas prefiro os métodos de antigamente, onde se sentia o outro presente, se olhava nos olhos, se cheirava e escutava, com um interesse despertado pelo ser humano real que ali estava e não por um perfil virtual, cujas fotos poderiam ser reais, mas também poderiam ter sido baixadas de algum catálogo de moda por aí, e que muito provavelmente desperta numa pessoa solitária expectativas não muito condizentes com a realidade.
Sinceramente, prefiro ir dançar e “esfregar o bucho”, a alma e tudo que tenho direito. Todos deveríamos dançar e “nos esfregar” mais. Afinal, já que é para conhecer o “amor de sua vida”, vale a pena investir mais que apenas uma esfregada com o dedo indicador esticado, não é mesmo?
Vá dançar! ?
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