Era um dia de calor tórrido. Estava eu num sítio em uma área gramada e sem árvores grandes ao meu redor. Não aguentava mais de calor, transpirava ininterruptamente, quando a corrente de vento trouxe uma bela nuvem. Que sombra maravilhosa, que belo alívio!

Aquele instante de frescor durou cerca de dez minutos, tal a extensão dela. Entretanto, infelizmente ela se foi e o calor voltou.

E ficou a reflexão: a abençoada nuvem chegou, deixou sua marca e partiu, para sombrear outras pessoas e seres vivos. Como foi feliz aquele instante. Horas depois, quando refletia novamente sobre sob a sombra de uma árvore pensei que o Fulano calorento que fui não existe mais, e ela agora já deve ter crescido e despejado chuva em algum canto. Nem eu era mais o mesmo, nem ela.

Quantos de nós já não sentimos frio na barriga ao pensar em nos despedir de algo ou alguém? Se afastar de uma pessoa, por exemplo, não é algo confortável. Ter alguém ali, e em um determinado momento não poder contar mais com essa presença é algo desafiador. É preciso se readaptar, muitas vezes após muito relutar e sofrer.

Toda hora de despedida acaba sendo dolorida. Por vezes esse angustiante acontecimento vem motivado por um acidente, por uma preferência minha, pela escolha de outra pessoa, ou até mesmo pela morte. Quando me despeço de uma pessoa, de um lugar, de um emprego ou de um sonho, algo de mim perde identidade. Se me apoio em algo e esse algo se desloca, eu mesmo perco o eixo.

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Entretanto, aí está a fonte de toda a não aceitação que muitas vezes decorre desses momentos de baque e readaptação. Quando acredito realmente que minha autorrealização depende de determinada pessoa, lugar ou circunstância, quando essa condição é abalada, todos os meus alicerces também o são.

E não falo aqui do luto que decorre desse tipo de momento. Tristeza e tempo para readaptação são necessidades naturais para um momento de despedida. Entretanto, se eu compreendo que cada momento, cada circunstância, cada projeto e cada pessoa me oferecem oportunidades únicas de realização, o tempo do luto transcorre, é superado, e a vida prossegue.

Se eu perco a companhia de uma pessoa decorrente da morte corporal, certamente aquela presença física não terei mais comigo. Mas o legado permanece. O carinho e todas as heranças físicas e emocionais seguem vivas dentro de nós mesmos. E quem sabe a vida não reserva a alegria de um sonho feliz com a visita dessa pessoa? Dessa forma a vida prossegue, com novos projetos, novas alegrias e lições que a cada momento batem a nossa porta. E a lembrança dessa pessoa segue viva e serena como pano de fundo para todos eles.

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Se eu preciso me despedir de minha terra querida, certamente certas companhias, mares, montanhas e estradas não mais terei à minha disposição. Porém, uma nova terra me espera, com novas possibilidades de companhias, alegrias e aprendizados, e se um dia eu tiver a oportunidade de retornar, serei uma outra pessoa, mais madura e experiente, afim de contribuir de alguma forma em favor da minha terra natal.

No fim das contas, não existe uma despedida definitiva. Todo momento de afastamento só ressalta as marcas que aquele contato me causava. Só posso então perceber que aquela pessoa ou circunstância já era parte integrante de mim. Isso permanece, e nada nem ninguém poderá me retirar.

O que se afasta de mim – me refiro aqui a uma presença física, a algo que meus olhos podem ver e minhas não podem tocar – muitas vezes é algo que a vida achou por bem afastar. Só me cabe compreender que as coisas que tem início, necessariamente tem um fim. Aceitar. A vida segue, assim como novos começos e novos finais se sucedem infinitamente…

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Cada despedida é assim um novo início, e todas as experiências anterioremente vivenciadas são o que há de nutrir o meu olhar e minhas mãos diante do que a vida me presentear…

Não precisamos temer despedidas. Se em um momento a sombra que alivia meu calor surge para mim, ela se vai em outro. Mas depois outras sombras virão me acariciar, enquanto que aquela primeira estará sempre viva em forma de gratidão diante do inesperado da existência…

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Psicólogo, reside no Rio de Janeiro e é colunista do site Fãs da Psicanálise.

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