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O raro e precioso dom de ouvir

Uma vez, vi no Facebook um post que apresentava um pensamento muito interessante: muitas pessoas buscam por cursos de oratória pois querem aprender a falar bem. Existem ainda aqueles que procuram cursos livres de teatro ou dança para aprenderem a interagir mais e melhor. Para aprenderem a se comunicar e a se expressar com mais fluidez.

Não nego em nenhum momento o valor de falar bem, de se expressar com clareza e tranquilidade. Só quem é tímido ou já foi, sabe o quanto é complicado querer falar, mas não encontrar as palavras ou a coragem para pronunciá-las por medo do julgamento.

Sabe-se que quem se expressa melhor têm mais oportunidades tanto profissionais como afetivas. Mas por outro lado, está faltando gente no mundo para ouvir. E é aí que entra o tal post do Facebook. Nele, o autor afirma que não existem cursos para aprendermos a ouvir.

A gente se esquece, às vezes, de que no processo comunicacional tanto o emissor como o receptor são elementos essenciais. Se não há ninguém para escutar, não há comunicação. Ou se quem fala não se faz entender, a comunicação foi ineficaz.

Enfim, não adianta todo mundo querer falar bem, se expressar, se o número de ouvintes diminui cada vez mais. Sem plateia não existe o artista. Sem aluno não existe professor. Sem quem nos escute , não há maneira de nos revelarmos em toda a nossa plenitude.

Quando a gente desabafa sobre um problema, nos sentimos satisfeitos e aliviados quando encontramos naquele que nos escuta, um ouvinte atento e dedicado. Caso contrário, as sensações de abandono, vazio e solidão só se agravam.

Sim, ouvir é uma arte. É um dom raro e precioso. Na nossa cultura, muito expansiva, de gestos amplos e extrovertidos, escutar é um desafio e tanto porque a gente quer falar, mostrar, demonstrar alto e em bom som. Os nossos dramas sempre são piores e mais complicados e dolorosos do que os dos outros.

As nossas alegrias e conquistas sempre são mais coloridas e possuem mais glitter. Normalmente , a nossa vida , as nossas experiências são sempre exemplos mais significativos dos temas sobre os quais conversamos ao redor de uma mesa de bar ou em qualquer outro lugar menos informal.

Muitos imaginam que ouvir é passivo. Mas ouvir é uma atitude. É uma escolha. Uma escolha afetiva e racional simultaneamente. Ouvir nada tem a ver com passividade, pois o silêncio também comunica e a atenção, carinho e respeito que se dedica ao outro que fala pode ser determinante para fazer quem fala ressignificar seus dramas e questionamentos de uma forma muito mais lúcida e leve.

Quando interrompemos a fala para criticar, julgar e preencher as lacunas do falante com os nossos conteúdos, dificilmente estaremos ajudando de alguma forma quem precisa ser ouvido.

(Imagem: fauxels)

Sílvia Marques

Profa. doutora , idealizadora da Pós em Cinema do Complexo FMU, escritora e psicanalista. É colunista do site Fãs da Psicanálise.

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