O medo da morte já fez com que muita gente perdesse a alegria de viver. E, até recentemente, as correntes religiosas, filosóficas e científicas dominantes pareciam ter pouco a oferecer a essas pessoas angustiadas. Para as gerações mais velhas, era melhor nem pensar na morte. Pois o que isso trazia à memória eram as aulas de religião da escola primária, com suas descrições apavorantes do inferno e do purgatório, ou os livros materialistas lidos na adolescência, nos quais toda a consciência se extinguia com o último suspiro. Entre os cenários punitivos e a falta de qualquer perspectiva, havia pouco espaço para o conforto e a esperança.
Os jovens de hoje têm o privilégio de respirar uma atmosfera bem menos opressiva. Graças ao fantástico progresso dos procedimentos médicos e das técnicas de reanimação, cada vez mais pessoas vêm sobrevivendo a episódios de morte clínica (caracterizados pela parada cardíaca). E os relatos que muitos fazem dessas situações-limite, daquilo que viram, ouviram e sentiram na trajetória interrompida para o “lado de lá”, apresentam uma nova visão da morte e da própria vida. Em lugar da angústia de caminhar para o completo aniquilamento, eles falam da certeza absoluta de que estavam apenas transitando de um plano a outro da existência. E, embora alguns reportem vivências aflitivas, talvez provocadas por memórias carregadas de culpa, a maioria descreve extraordinárias experiências de luz e plenitude, sábias reavaliações dos momentos vividos, encontros com entes carregados de compreensão, compaixão, amor e até mesmo bom humor.
Nos Estados Unidos, essa vivência incomum foi batizada com a sigla NDE, formada pelas iniciais da expressão Near Death Experience – Experiência Próxima da Morte, às vezes também traduzida como Experiência de Quase-Morte. Desde a década de 1970, ela vem sendo estudada, com rigores do método científico, por médicos, psiquiatras, psicólogos e tanatólogos – como são chamados os pesquisadores do fenômeno da morte. Pesquisas realizadas nos Estados Unidos, na Austrália e na Alemanha sugerem que de 4% a 15% das respectivas populações já vivenciaram episódios de NDE [Fonte: International Association for Near-Death Studies, http://iands.org/home.html].
Um forte zumbido
No Brasil, a psicanalista paulista A. é uma das muitas pessoas que chegou ao limiar da morte com a consciência plenamente desperta. A experiência ocorreu quando um abcesso provocou em seu organismo uma infecção generalizada. Sua condição física deteriorou-se rapidamente e a pressão arterial chegou perto de zero. Na UTI, A. sentiu-se desfalecer. “Tive a impressão de que minha ‘imagem’ saía do corpo. Ela mantinha minha forma corpórea, mas era semitransparente. Meu pensamento acompanhava essa ‘imagem’, que flutuava perto do teto. De lá, eu via meu corpo. Porém já não o sentia mais”.
Ao se desapegar do corpo, A. percebeu-se entrando em um túnel, em fantástica velocidade. “Havia um forte zumbido. À medida que eu avançava, vinham-me imagens de meu passado remoto, dos tempos de criança. Eram cenas comuns, brincadeiras infantis. Ao mesmo tempo, uma voz interna, inaudível, me perguntava: ‘O que você aprendeu com isso? Valeu a pena?’. Eu experimentava uma incrível sensação de leveza, de paz e de felicidade”.
Em determinado momento, A. lembrou-se de que vinha atendendo, como psicanalista, um garoto muito pobre. Era um caso grave, ao qual se dedicou com afinco, recebendo, por isso, pagamento puramente simbólico.
Então, ela afirmou: “Ajudei essa pessoa”. Como se quisesse dizer: “Será que isso conta ponto a meu favor?”. E a voz perguntou-lhe: “Você aprendeu com isso?”. “Muito”, ela respondeu. Ao que a voz concluiu: “Então valeu a pena, para você”. A. sentiu-se imensamente reconfortada. Ela compreendeu qual era o verdadeiro sentido daquele diálogo. “Não era cobrança ou julgamento moral, mas uma avaliação tranquila”.
Enquanto contemplava imagens há muito tempo esquecidas, A. deu-se conta de que o túnel em si era escuro, com as paredes desfocadas pelo excesso de velocidade. Mas, na saída, havia uma luz de intensidade indescritível. “Naquela luz, vislumbrei um jardim. E, ao deixar o túnel e entrar nele, vi que era muito espaçoso, com gramados verdes e árvores enormes. A sensação que ele transmitia era tão pacífica, tão deliciosa, que eu jamais ia querer sair de lá. No jardim, percebi um banco, com três pessoas sentadas. Não consegui ver seus rostos, mas, à medida que fui me aproximando, elas começaram a se movimentar, como que para me receber. A primeira chegou perto; a segunda, até o meio do caminho; a terceira ainda permanecia sentada”.
O processo foi, então, bruscamente interrompido. Porque, enquanto enxergava o jardim e as três pessoas, A. continuava visualizando as imagens de sua vida. E, de repente, viu uma foto onde apareciam seus dois filhos mais velhos, que, na época, ainda eram bebês. “Nesse instante, eu gritei: ‘Não posso morrer! Tenho dois filhos pequenos e eles precisam de mim!’”.
Foi a primeira vez, durante toda a experiência, que lhe veio a ideia de morte. ‘Eu não tive medo, mas o amor por meus filhos me puxou imediatamente de volta. Senti como se levasse uma pancada na cabeça. Abri os olhos e me vi outra vez em meu corpo, na UTI. A partir de então, minha pressão subiu e eu pude ser operada”.
Como já aconteceu com muitas outras pessoas, essa experiência trouxe para A. mudanças de vida radicais. “A principal foi que eu voltei a acreditar em Deus”, disse. Desde a adolescência, a psicanalista havia incorporado a ideia de que Deus é uma invenção humana, destinada a compensar nossas fraquezas, medos e limitações. Depois de passar pelo que passou, ela compreendeu que há muito mais coisas entre o Céu e a Terra. “A segunda mudança importante foi em relação aos valores. Entendi que a gente está aqui para aprender, para evoluir, para se tornar uma pessoa melhor”.
Duas figuras de luz
B. passou por experiência semelhante em março de 1986. Pedagoga e cientista social, ela viveu um grave episódio de arritmia cardíaca, que provocou sua morte clínica. Na UTI, percebeu-se saindo do corpo. “Fui levada para dentro de uma turbulência circular”, afirmou.
Era um túnel bastante escuro, no qual ingressou em alta velocidade. “De lá fui arremessada para um lugar intensamente iluminado. Não havia nenhuma paisagem, nenhum cenário, só uma luz transcendental. Senti uma paz e uma tranquilidade indescritíveis. E, quando estava imersa naquela sensação, vi duas figuras se aproximando. Eram duas figuras de luz. Eu não conseguia distinguir perfeitamente suas feições, mas percebi que um tinha barba e o outro usava um chapeuzinho na cabeça”.
B. está convencida de que as aparições eram Jesus e Dom Bosco, um padre e educador italiano do século XIX que foi canonizado pela Igreja Católica. Com uma vida inteira dedicada aos pobres e marginalizados e às crianças abandonadas, Dom Bosco sempre foi o modelo que inspirou B. “Todo o meu trabalho como educadora se baseia em seu exemplo. Ao vê-lo em companhia de Cristo naquele mar de luz, senti um desejo imenso de encontrá-los. Mas, quando estava quase chegando, eles fizeram um sinal para eu voltar. E, nesse mesmo momento, comecei a recapitular minha vida anterior e lembrei-me de minhas duas filhas. Retornei, então, pelo mesmo turbilhão. Revi meu corpo na UTI e os médicos fazendo um esforço desesperado para reanimá-lo. Senti um tranco e ouvi um dos médicos dizer: ‘Ela está viva’”.
Como aconteceu com A., B. foi profundamente afetada pela experiência. “Voltei à vida com uma força incrível: estou muito mais criativa, realizo várias atividades ao mesmo tempo, quase nunca me canso e consigo me lembrar das coisas nos mínimos detalhes. Também aumentou muito o meu amor pela humanidade, o meu compromisso com os pobres e marginalizados. Passei a dedicar minha vida às crianças e adolescentes em situação de risco pessoal e social: crianças aidéticas, prostituídas, analfabetas, excluídas da sociedade. A elas, todo o dia, eu desejo um bom dia. E, ao fazer isso, sinto-me em estado de graça”.
O que mais impressiona nas experiências próximas da morte é a semelhança dos relatos. Embora não haja uma só narrativa que seja rigorosamente igual a outra, a grande maioria segue um roteiro básico, cuja incidência desafia qualquer tentativa de qualificar essas vivências como meras alucinações.
O roteiro básico das NDEs
Da parada cardíaca ao final da reanimação, tal roteiro obedece, em linhas gerais, a dez etapas bem delimitadas:
- A pessoa sente-se desprender do corpo e, nesse momento, cessa todo o desconforto, a dor e a aflição que a acompanhavam.
- Uma forma semelhante ao corpo, porém mais sutil, passa a flutuar alguns metros acima do chão. A consciência individual da pessoa mantém-se ligada a essa forma e, do alto, observa o corpo inerte lá embaixo.
- A consciência registra todas as imagens e sons do ambiente. Caso se trate de uma UTI, ela pode ver e ouvir o funcionamento dos aparelhos e o esforço da equipe médica envolvida na reanimação do corpo.
- Em um dado momento, a consciência desinteressa-se por essas informações e, mudando o seu ângulo de visão, percebe a existência de um vórtice ou túnel, que a atrai com força irresistível.
- A forma-consciência penetra no túnel e desloca-se através dele em velocidade estonteante. Um forte zumbido, difícil de qualificar, acompanha o deslocamento.
- Enquanto se desloca, a pessoa recapitula criticamente sua vida. As memórias que emergem dificilmente seriam consideradas importantes em estado ordinário de consciência. Revelam-se, no entanto, altamente significativas, no contexto da avaliação. A experiência inteira não obedece aos padrões usuais de espaço e tempo. Toda uma existência pode ser rememorada em poucos segundos.
- No final do túnel, a consciência percebe uma luz, cujo esplendor não tem paralelo com nenhum fenômeno luminoso do mundo material. Essa luz lhe transmite uma extraordinária sensação de paz, plenitude e felicidade. Ela quer ingressar na luz e de forma alguma deseja regressar ao corpo físico.
- A súbita emergência de uma memória específica interrompe o processo. A pessoa se lembra de entes queridos ou de alguma outra questão pendente em sua vida.
- Ela sente, então, uma forte pancada. E a forma-consciência se reacopla ao corpo físico.
- O quadro clínico da pessoa sofre uma súbita e inexplicável melhora.
Esse roteiro básico pode ser enriquecido pela descrição de cenários deslumbrantes, como o jardim visto por A. na outra extremidade do túnel. Por comunicações com parentes ou amigos falecidos. Ou pelo encontro com entes de luz, que transmitem à pessoa um sentimento de amor incondicional.
Em determinados relatos, esses entes são descritos como “anjos” ou “guias”. Em outros, são associados às figuras de santos, profetas, grandes mestres espirituais ou avatares (manifestações divinas). No caso dos “anjos” ou “guias’, algumas pessoas afirmam que os viram antes mesmo de sair do corpo físico, ou pouco depois de fazê-lo, e que foram conduzidas por eles ao longo de toda a experiência. Já as outras manifestações ocorreriam principalmente depois da travessia do túnel.
Um templo no espaço
No campo da psicologia, tais ideias não deveriam provocar grandes surpresas, pois um dos luminares dessa disciplina, o psiquiatra suíço Carl Gustav Jung (1875-1961), vivenciou fantástica experiência visionária após sofrer um enfarte cardíaco. Em estado de coma, ele viu-se fora do corpo e do próprio planeta. “Parecia-me estar muito longe, no espaço cósmico”, relatou anos depois. “Abaixo de mim, eu via o globo terrestre, banhado por uma maravilhosa luz azul. Justamente sob os meus pés estava o Ceilão (Sri Lanka) e, na minha frente, estendia-se o subcontinente indiano”.
Mais tarde, Jung informou-se a que distância da Terra deveria estar para visualizar tal amplidão: cerca de 1.500 quilômetros! Em uma época na qual os aviões não ultrapassavam a altitude de 10 quilômetros, essa visão era inimaginável. Ela só se tornaria acessível à humanidade no início dos anos 1960, com os primeiros voos espaciais tripulados. Após um momento de contemplação, o psiquiatra virou-se. Algo novo surgiu em seu campo visual. “A uma pequena distância, percebi no espaço um enorme bloco de pedra, escuro como um meteorito, quase do tamanho de minha casa”.
Escavado na rocha do meteorito, havia um templo semelhante a muitos que existem na Índia. “Uma entrada dava acesso a um pequeno vestíbulo. À direita, sobre um banco de pedra, estava sentado, na posição de lótus, completamente distendido e repousado, um indiano de pele bronzeada, vestido de branco. Esperava-me sem dizer uma palavra. À esquerda, abria-se o portal do templo. Vários nichos, cheios de óleo de coco, em que ardiam mechas, cercavam a porta com uma coroa de pequenas chamas claras”.
Enquanto chegava perto do meteorito, o psiquiatra sentiu que tudo o que ele tinha sido até então se afastava dele ou lhe era arrancado. Ao mesmo tempo, tinha certeza de estar se aproximando do lugar onde iria encontrar o grupo de entes humanos ao qual realmente pertencia e onde seriam respondidas as grandes perguntas pendentes de sua vida. Enquanto pensava nessas coisas, um fato atraiu sua atenção: lá de baixo, da Europa, ergueu-se uma forma. Era seu médico, ou melhor, a forma dele, circundada por uma corrente de ouro. “Quando ele chegou diante de mim, pairando como uma imagem nascida das profundezas, produziu-se entre nós uma silenciosa transmissão de pensamentos”.
Seu médico fora delegado pela Terra para trazer-lhe uma mensagem: ele devia retornar. “No momento em que percebi essa mensagem, a visão desapareceu”. Jung saiu do coma e, em três semanas, recuperou-se totalmente. Mas essa experiência marcou-o para sempre: entre outras lições, ficou a certeza de que tudo o que valorizamos como sendo a vida é apenas um pequeno fragmento da existência.
Encontro com Cristo
Visões tão poderosas como esta explicam por que as experiências próximas da morte ganharam as páginas de um sem-número de livros e inspiraram filmes de sucesso. Alguns médicos não hesitariam em classificar esses casos como alucinações, provocadas pela overdose de medicamentos ou pelo colapso das funções vitais. Esta é a interpretação-padrão e não resta dúvida de que realmente dá conta de vários episódios. Mas tal explicação de forma alguma esgota o assunto.
“Devido à interrupção momentânea da irrigação sanguínea, associada ao uso de remédios durante as manobras de ressuscitação, podemos supor que a retomada das funções cerebrais seja acompanhada de distorções sensoriais”, afirmou um neurologista brasileiro [cujo nome e credenciais acadêmicas foram suprimidos nesta postagem, conforme digo na nota de rodapé]. “Isso explicaria fenômenos mais simples, como a visão de luzes e a audição de sons inarticulados, ou até mesmo certas alucinações. Porém, fenômenos mais complexos e cujos relatos se repetem, como por exemplo ver o corpo do lado de fora, continuam sem explicação do ponto de vista neurológico. Não creio que sejam sonhos, pois seria difícil o cérebro dedicar-se a uma função tão sofisticada em um momento em que está entrando em colapso”.
Foi uma vivência descrita como encontro com Cristo que inspirou o médico americano Raymond Moody a iniciar a mais célebre pesquisa das experiências próximas da morte, relatada no livro Life After Life (Vida Depois da Vida). O caso foi contado a Moody pelo psiquiatra Georges Ritchie, que, em 1943, quando ainda era um jovem soldado, sofreu uma severa pneumonia, teve picos de febre altíssimos e entrou em estado de coma. Horas depois de ter mergulhado na inconsciência, Ritchie acordou, levantou da cama e começou a percorrer os corredores do hospital. Mas descobriu que ninguém parecia ouvi-lo ou enxergá-lo. E mais: as pessoas atravessavam o que ele julgava ser o seu corpo sem a menor dificuldade. Espantado, ele voltou ao quarto e percebeu seu verdadeiro corpo estendido sobre o leito.
Nesse instante, uma luz extraordinária entrou em seu campo visual. Pouco a pouco, ele começou a divisar, nessa luminosidade, uma forma humana. E, quando sua consciência assimilou a percepção, Ritchie ouviu, dentro de si mesmo, uma ordem inquestionável: “Fique de pé, pois você está na presença do Filho de Deus”. Anos mais tarde, ele disse a Moody que aquele não era o Jesus de seus livros de catecismo. “O Jesus desses livros era gentil, amável, compreensivo e talvez um pouco fraco. Aquele personagem era o próprio poder, mais idoso que o tempo e no entanto mais moderno que qualquer pessoa. O que emanava dessa presença era um amor incondicional”.
Na frente dessa figura impressionante, o rapaz viu desfilar toda sua vida. E ficou muito embaraçado ao deparar com as experiências sexuais da puberdade. Mas aquilo não pareceu chocar nem um pouco o seu interlocutor. Este perguntou-lhe então: “O que você fez em sua vida que possa me mostrar”. Sem conseguir encontrar nada que valesse a pena, Ritchie argumentou que não tinha o que mostrar porque ainda era muito jovem para morrer. Ao que o personagem replicou: “Ninguém é jovem demais para morrer, porque se trata apenas da passagem de uma realidade a outra”. E levou-o para conhecer cinco dessas outras realidades.
Depois de visitar mundos que jamais sonhou existir, Ritchie mergulhou outra vez na inconsciência. Enquanto isso, os médicos o davam como clinicamente morto. Inconformado, um médico residente resolveu fazer uma última tentativa e enfiou uma agulha hipodérmica no coração do soldado. O músculo voltou a bater.
Pesquisas consistentes
O livro de Moody foi publicado pela primeira vez em 1975, com uma tiragem modesta de 2 mil exemplares. Para surpresa do pesquisador e de seus editores, já foram vendidos dezenas de milhões de volumes, em dezenas de idiomas diferentes. Sua investigação pioneira foi amplamente confirmada pelas criteriosas pesquisas de outros cientistas, como os cardiologistas americanos Maurice Rawlings e Michael Sabom. O curioso é que esses dois médicos não tinham até então qualquer interesse por temas espirituais e consideravam as descrições das NDE um mero sensacionalismo da imprensa. Porém, foram obrigados a rever tal ponto de vista ao depararem com casos vivenciados por seus próprios pacientes.
Mas a prova mais conclusiva da veracidade das experiências próximas da morte foi fornecida pela pesquisa do pediatra americano Melvin Morse. Liderando uma equipe composta por um anestesista, um neurologista e um psiquiatra, Morse verificou que, depois de terem passado por episódios de morte clínica, também crianças, de diferentes idades, condições sociais e credos religiosos, descreviam vivências que seguiam o roteiro clássico das NDE. A investigação foi provocada por uma ocorrência excepcional, atendida por Morse. Trata-se do caso de Krystel Merzlock, na época uma menina de 7 anos de idade. Após um afogamento, a garota teve parada cardíaca e permaneceu em condição de morte clínica durante nada menos de 19 minutos!
Segundo acredita a medicina, caso o coração fique três minutos sem bater, o processo de morte torna-se irreversível, porque as células cerebrais começam a ser destruídas por falta de oxigenação. Mesmo que o coração volte a funcionar, o cérebro sofre lesões irreparáveis. Pois bem, a despeito de todas as crenças oficiais em contrário, a pequena Krystel voltou à vida. E, o que é ainda mais extraordinário: sem qualquer sequela neurológica.
Quando a interrogou, dias mais tarde, Morse descobriu que Krystel tinha perfeita consciência dos procedimentos utilizados durante a reanimação. Mas as surpresas do médico estavam só começando. Seu sistema de crenças seria ainda mais radicalmente posto à prova, quando Krystel lhe contou que fora levada por seu “Anjo da Guarda” à presença do “Pai Celeste’. Este teria perguntado se ela queria ficar com Ele ou regressar para os pais. Em um primeiro momento, a menina decidiu ficar, mas, depois de ter a visão de seus irmãos brincando, resolveu voltar para casa.
Morse pôs-se a pesquisar as NDE infantis. Porém, apesar do insólito relato de Krystel, suas convicções cientificistas falaram mais alto e ele adotou a hipótese de que as percepções que acompanhavam essas ocorrências eram simples alucinações provocadas pelo coquetel de medicamentos ministrado aos pacientes e pelas substâncias que o próprio organismo libera na iminência da morte. A intenção de Morse e sua equipe era provar, cientificamente, que Raymond Moody estava errado. A pesquisa, porém, demonstrou exatamente o contrário. Depois de tabular e analisar 200 entrevistas, Morse concluiu que as experiências não poderiam, de forma alguma, ser reduzidas a meros episódios alucinatórios.
Enquanto os médicos abordavam o assunto por um lado, a psicologia se aproximava dele pelo outro. E, nesse campo, nenhuma contribuição se iguala à do psiquiatra tcheco Stanislav Grof. Durante décadas e trabalhando com dezenas de milhares de voluntários, ele realizou uma revolucionária pesquisa da mente. Num primeiro momento, recorreu a altas doses de dietilamida de ácido lisérgico (LSD) para provocar estados não usuais de consciência nas pessoas pesquisadas. Mais tarde, substituiu a droga por um método não químico, conhecido como “respiração holotrópica”. Neste, os participantes respiram de forma específica, enquanto ouvem músicas de alto poder evocativo e são submetidos, eventualmente, a certas intervenções corporais localizadas.
Após registrar e analisar meticulosamente os relatos de milhares de indivíduos, o psiquiatra convenceu-se de que nem o LSD nem a respiração holotrópica produziam alucinações. Eles atuavam, isto sim, como amplificadores da atividade psíquica, permitindo que conteúdos inconscientes se tornassem explícitos. E, entre esses conteúdos, estavam os cenários e roteiros descritos nas experiências próximas da morte. Em outras palavras, nos trabalhos coordenados por Grof e seus seguidores, muitas pessoas, plenamente vivas, tiveram as mesmas visões e sensações que caracterizam as NDE. E, o que é mais interessante: essas visões e sensações coincidiam, muitas vezes nos mínimos detalhes, com narrativas sobre o “Além” sustentadas por diferentes tradições espirituais, mas que eram antes totalmente ignoradas pelas pessoas envolvidas nos experimentos.
O sapato estava lá
A pesquisa de Grof reforçou a ideia de que as experiências visionárias próximas da morte não eram fantasias alucinatórias, mas expressavam algum tipo de contato com outros níveis da realidade. Esses mesmos domínios podiam ser visitados por pessoas vivas e saudáveis, em estados ampliados de consciência.
A pressa com que alguns cientistas descartam as experiências próximas da morte tem mais a ver com a defesa intransigente de um sistema de crenças do que com uma atitude realmente científica. Para esse tipo de mente cética, que só acredita no que os olhos veem, certos relatos apresentam talvez um desafio insuperável. É o caso deste episódio, levantado por Raymond Moody. Uma paciente, de nome Maria, é declarada morta. Após a reanimação, seu coração volta a bater. Ela recobra a condição de falar e conversa com Kim, a médica que a atendeu. Diz-lhe, então, que, durante a saída do corpo, sua forma-consciência flutuou pelo hospital e encontrou um sapato velho no batente da janela de um andar mais alto. Muitos especialistas simplesmente encarariam Maria com um sorriso incrédulo, pensando consigo mesmos: “Pobrezinha, alucinou”. Kim, porém, resolveu conferir. O sapato estava lá.
As opiniões de quatro estudiosos das tradições espirituais
Leonardo Boff, teólogo cristão e escritor
“A morte não é um fenômeno pontual. É um processo. Se as pessoas voltam é porque esse processo não se concluiu. Mesmo assim, há o desprendimento parcial, com enorme alargamento da consciência e o encontro com um mundo que já pertence ao Divino. A morte em nossa cultura constitui um trauma terrível, porque é sempre entendida como negação da vida. Porém, nessas experiências, o que se vê é a ampliação da vida, o acesso a uma dimensão da qual as pessoas só retornam com muita relutância. Na própria morte dá-se a ressurreição. Não como devolução à vida. Mas como realização plena das virtualidades do ser humano”.
Nilton Bonder, rabino e escritor
“Trabalhei em hospitais, com doentes terminais, nos Estados Unidos. E presenciei várias situações dessas. O que mais impressiona é a euforia com que as pessoas relatam suas experiências. Eu acho que, nessas ocasiões, elas realmente fazem contato com a verdadeira natureza humana, com a fonte da existência. Mas não têm, necessariamente, uma visão objetiva. Porque há também um aspecto onírico, alucinatório, causado pela intoxicação do corpo. Para o judaísmo, a morte é um longo processo, que dura 11 meses. Segundo a mística judaica, a alma possui sete camadas e a morte só se completa quando a mais sutil delas finalmente se desprende do mundo físico”.
Ricardo Mário Gonçalves, monge budista e historiador
“No budismo, existe uma tradição, segundo a qual, se a pessoa estiver preparada, um ser de luz, o Buda Amida, se manifesta a ela na hora da morte, para conduzi-la ao paraíso, a Terra Pura. Tanto o Buda Amida quanto a Terra Pura devem ser entendidos como metáforas, pois, no budismo, nada tem existência objetiva. Tudo é metáfora. O Buda Amida representa a plenitude da sabedoria e da compaixão e a Terra Pura é uma representação do Nirvana. A crença na manifestação do Buda inspirou toda uma literatura sobre a arte do bem morrer. As principais técnicas preconizadas por essas obras são a visualização da Terra Pura e a recitação do nome de Amida”.
Antonio Cesar Perri de Carvalho, presidente da Federação Espírita Brasileira e professor
“Nas experiências próximas da morte, o espírito ganha uma emancipação parcial, semelhante à que ocorre em certos sonhos. Os relatos sobre a travessia do túnel coincidem inteiramente com o que dizem os espíritos psicografados pelo médium brasileiro Francisco Xavier. A visão da luz sobrenatural não significa que o espírito esteja entrando em contato com Deus ou com seres altamente iluminados. Ela apenas assinala seu ingresso em um outro domínio da existência, a dimensão incorpórea. Os cenários vistos nesse domínio concordam inteiramente com as descrições do mundo espiritual fornecidas pelo visionário sueco Emanuel Swedenborg (1688-1772)”.
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Nota
Uma versão anterior desta reportagem foi publicada por mim, há muito tempo (não me lembro quando), na revista Galileu (ex-Globo Ciência). Recentemente, navegando na internet, descobri que vários sites a haviam reproduzido. Foi em um deles que recuperei meu texto. Mas, ao postá-lo neste blog, resolvi fazer algumas alterações:
1. A reportagem original continha três depoimentos de mulheres que supostamente vivenciaram episódios de “Experiência Próxima da Morte” ou “Experiência de Quase-Morte” no Brasil. Ao reler o material, um desses depoimentos me pareceu menos consistente. Por isso, resolvi suprimi-lo.
2. Com relação aos dois depoimentos que foram mantidos, as depoentes eram identificadas, na reportagem original, pelas iniciais do nome, em um caso, e pelo nome completo e outras informações biográficas, no outro. Como faz muito tempo que entrevistei essas pessoas, e considerando que elas podem ter mudado de ideia em relação a divulgar episódios tão íntimos, decidi suprimir a identificação. Assim, neste texto, chamei a primeira depoente de A. e a segunda depoente de B., sem dar mais detalhes.
3. Pelo mesmo motivo, suprimi o nome de um neurologista que entrevistei na ocasião, mantendo, porém, sua opinião sobre o fenômeno.
4. Atualizei alguns dados estatísticos internacionais com base em uma pesquisa feita no site da International Association for Near-Death Studies http://iands.org/home.html.
5. Para maior clareza, modifiquei as quebras do texto e troquei alguns intertítulos.
6. A reportagem original continha algumas frases ou expressões “espertas”, que, na época, faziam parte do meu jeito de escrever. Com a idade, esses truques redacionais tornaram-se para mim desagradáveis. Por isso, passei o texto todo por um filtro de sobriedade. Acho que o mundo atual está cheio de pessoas “espertas”. Eu não preciso ser uma delas.
(Autor: José Tadeu Arantes (Kabir))
Jesus foi preparar nosso lugar. Quem que em Cristo não morre eternamente! Momento lindo deve ser o encontro com nosso Senhor!
Eu acredito que não existe morte, apenas evolução do espírito que precisa de um corpo para actuar, para mim tudo que morre nasce de novo, portanto, somos seres imortais independentemente de de sermos boas ou más pessoas…
rose comentário correto e está no caminho;Virgínia Jorge comentário infeliz e perturbador, só certa numa coisa ”somos imortais”. fora isso é um loucura sem fim, poderia fazer um livro da sua loucura, mas vou resumir….Sem jesus o fim é o inferno, com Jesus a vida eterna, caiu no inferno nunca sai de la, só tormento e dor, ninguém volta para se redimir, é um engano do diabo, você precisa de Jesus urgente.
Já passei por essa experiência,por causa de um acidente de carro,vi meu corpo flutuando e o carro abaixo de mim,estava acima das palmeiras que tinham na rua e depois é assim mesmo:um túnel onde vi minha vida, vi pessoas e a luz no fundo,ao voltar parece que estamos na velocidade da luz….acordei no hospital e por anos fiquei me perguntando o que teria sido aquilo.meu sobrinho ficou em coma por 86 dias a 3 anos atrás e quando voltou disse que conversava com Jesus e que minha mãe falecida cuidava dele.disse que Jesus
mandou ele voltar mais ele não queria e por fim Jesus disse que não era hora dele que ele tinha ficado muito tempo e já era hora de voltar.ele descreve Jesus moreno cabelos curtos castanhos escuros e que andava de skate tipo flutuando…