O Brasil tem hoje mais de 2 milhões de brasileiros com esquizofrenia, doença mental que causa surtos e é cercada de preconceitos. É cerca de 1% da população.
Deste total, 1,4 milhão de pessoas – ou 68% – não recebem qualquer tratamento. É que os remédios e consultas são caros. E a esquizofrenia é uma doença crônica que, muitas das vezes, impede o paciente até de trabalhar.
Com isso, o gasto recai sobre as famílias. E um outro fator engrossa esse número: a ignorância. Muitos não se tratam por acharem que não precisam mais ou porque não entendem que estão doentes.
A rede pública, apesar dos avanços, ainda não dá conta de atender a todos. O serviço é prestado pelos Centros de Atenção Psicossocial (CAPs). É lá que pessoas com doenças mentais passam parte do dia, recebem medicamentos e têm consultas com médicos. Acontece que nem sempre há psquiatras nas unidades e nem todas funcionam 24 horas.
– A maior parte dos CAPs funciona em horário comercial, e não há hora para um paciente piorar. Muitos entram em crise quando o CAPs já fechou ou vão para lá e não tem psiquiatra – conta a médica Fátima Vasconcelos, chefe do Serviço de Psiquiatria da Santa Casa de Misericórdia do Rio e membro da diretoria da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP).
A rede pública tem outro problema: por vezes, faltam remédios, e os medicamentos mais avançados sequer são comprados pelo poder público. Além disso, no Rio, apenas quatro unidades de saúde – Ipub, Pinel, CPRJ, Nise da Silveira – fazem internações. E só para os momentos de crise.
– Temos também as residências terapêuticas, que recebem pessoas que reconhecem que estão doentes e querem se tratar. Mas as vagas são poucas – destaca a psiquiatra Fátima Vasconcelos.
No meio de toda essa dificuldade, o Blog Emergência encontrou uma história que virou exemplo: a de Daniel Velloso, de 31 anos. Morador de Todos os Santos, na Zona Norte do Rio, ele ficou seis anos sem sair de casa por causa da doença. A coragem para romper o isolamento veio após iniciar o tratamento.
– Eu fiquei seis anos segurando um violão. E eu não tocava o violão. Uma voz me dizia que se eu soltasse o violão a minha cabeça ia cair – conta Velloso.
Após controlar a esquizofrenia com remédios – ele toma três por dia-, Daniel passou a contar sua história por onde vai. É visto como exemplo por muitas mães desesperadas. A doença o impediu de concluir os estudos, mas não de escrever um livro de poesias, o “Íris”, que ele vende nos eventos dos quais participa. Mas nada que lhe dê sustento. Os custos de seu tratamento – cerca de R$ 1 mil por mês – são arcados pela mãe.
– Eu quero ajudar as pessoas, mas também preciso de ajuda – diz.
Amor em meio ao tratamento
Há tempos, Daniel sentiu vontade de visitar clínicas psquiátricas e conversar com os internados. Numa das vezes, conheceu uma paciente e… se apaixonou. Era Laisa Lima, de 17 anos, que chegou a ficar internada sete meses por causa da mesma doença. Hoje, eles são namorados.
A jovem toma 12 remédios diferentes, um custo de uns R$ 2,5 mil, por mês. O pai dela, Wayne Pereira, de 38 anos, conta que gastou as reservas da família e até vendeu um computador para comprar medicamentos. Há um mês, criou uma vaquinha na internet, na qual tenta arrumar R$ 40 mil. Até aqui, só conseguiu cerca de 10% do esperado.
– E também participo de um grupo de familiares de esquizofrênicos. Um ajuda o outro com doações de medicamentos. Esse mês eu arrumei o remédio até dia 20 de maio. O trabalho de solidariedade que eles fazem é algo impressionante. Eu sou da opinião que solidariedade sem ação nada mais é do que hipocrisia. É exatamente o que elas praticam, ação em prol do outro. Quando cheguei nesse grupo não sabia nada e nem esperança eu tinha, o conteúdo de informações faz diferença na vida de alguém que vivencia isso – conta o pai.
A ainda limitada rede pública não consegue atender a todos. Quem pode, recorre à rede privada. Quem não tem dinheiro, deixa o parente sem tratamento – e muitos vão morar nas ruas.
Com o reforço de Daniel, Wayne e a esposa seguem buscando formas de ajudar Laisa. Em meio à luta diária que enfrenta desde que a filha apresentou os primeiros sintomas, o pai encara o alto custo dos remédios e uma grande ironia: ele é vendedor de planos de saúde, mas quem lhe assiste é a solidariedade alheia.
(Autor(a): Daniel Brunet)
(Fonte: blogs.oglobo.globo.com)
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