Com uma frequência maior do que eu gostaria, leio relatos de pessoas, em especial mulheres, que afirmam ter o ardente desejo de sair de uma relação abusiva, mas que não saberiam por onde começar, essencialmente, por falta de recursos financeiros. Para minha surpresa, quase sempre se trata de mulheres jovens, saudáveis e bem formadas, mas que, após anos de sequestro da subjetividade, estão completamente dependentes emocional e financeiramente de seus carrascos.
Estão diante da porta, mas afirmam, com os mais diversos argumentos, que não conseguem, de forma alguma, sair. Por fim, me perguntam como tratá-los, mudá-los, para que se tornem bons companheiros, de modo que a vida possa fluir “normalmente”. Em outras palavras, anos e anos de abuso poderiam ser esquecidos se eu pudesse fornecer a fórmula que lhes desse de volta o príncipe que as salvaria do mundo assustador que existe lá fora, para onde não desejam ir, cientes de toda a dor que teriam de experimentar para fazê-lo. Mais do que pessoas impossibilitadas, encontro mulheres com um incrível potencial, completamente paralisadas pelo MEDO.
Isso me lembra sempre uma citação de Salústio, que conheci durante a leitura do livro “Amar ou Depender?” de Walter Riso:
“São poucos os que querem a liberdade. A maioria quer apenas um amo justo.”
Sentir medo de fechar uma porta atrás de nós definitivamente, de recomeçar, de ousar, de romper paradigmas, de tocar em nossas feridas, de voltar ao ponto de partida para entender onde perdemos aquilo que não cessamos de buscar, de virar-se do avesso, de bater de frente com nossos temíveis demônios, de reconstruir o que quebramos em pedaços, de reconhecer erros em nós mesmos e de enxergar sem crueldade, mas nem tão pouco submissão os erros de quem conosco errou, tudo isso, aniquila nossa capacidade de ser livres.
Ninguém é livre sentindo medo, encarcerado por grades imaginárias daquilo que exige ação, mas que escolhemos evitar por terror de tomar para nós mesmos a responsabilidade de conduzir a própria história.
De alguma forma, nos esquivamos por muito tempo das obrigações impostas a quem deseja adentrar a vida adulta estando no comando dela, não como passageiro. Sentimos pavor diante do pensamento de abandonar o conforto da infância emocional e ficamos ali, quietinhos, esperando que alguém cuide de nós como se daquele tempo em que tínhamos 5 anos, não tivessem se passado 25, 30, 40. Queremos levantar vôo livre, mas o medo dessa liberdade nos incapacita e sabota.
E é por medo que passamos a direção de nossas vidas e nossas decisões aos outros ou às circunstâncias. Sabemos, inconscientemente ou não, que assim será mais fácil culpar alguém pelos inevitáveis fracassos que se sucederão, um após o outro, até que um dia decidamos nos tornar gestores de nossas vidas e tomadores de nossas próprias decisões e suas consequências.
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Assim, para a infelicidade (ou sorte) de quem busca essa fórmula mágica que lhe permita ser adulto sem ter de exercer suas funções, o que tem para hoje é que é preciso aceitar que não há meios de conduzir a vida nesses moldes e ao mesmo tempo ser dono de si. Crescer sendo livre exige CORAGEM.
Quando criamos coragem para sair de casa para encarar a solidão e dificuldades materiais e imateriais a tolerar a pseudo-companhia de um pseudo-amor; quando encontramos ânimo para começar uma faculdade a lamentar-se por ganhar menos do que os colegas formados; quando ousamos abrir aquele negócio ou mudar de emprego a tolerar um patrão opressor do velho cargo estável; quando trilhamos uma estrada de dor para pedir perdão a nós mesmos por todas as agressões a que nos submetemos a viver a amargura de jamais ter se dado a chance de saber como teria sido, é que perdemos o medo e damos aquele passo aterrorizante no tudo ou no nada, que nos desestabiliza para logo em seguida, proporcionar uma sensação de poder absoluto.
E é bem nesse instante que, aos perdemos o medo de existir no potencial pleno de cada um de nós, finalmente nos comportamos como SERES LIVRES e somos presenteados com um crescimento pessoal, intelectual e emocional jamais experimentado antes. Ao perder o medo, não importa em qual situação você se encontre, de um momento ao outro você não vê mais dentro de si aquela pessoa medíocre que tinha uma desculpa para tudo. Você encontra o comandante de sua aeronave com sede de muitas horas de voo, com ou sem turbulência.
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