Amor

Não liga não; é o meu jeito de amar

São 18 horas e 32 minutos; Leonardo comprou um buquê de flores, duas garrafas de vinho e preparou uma playlist no Spotfy que vai de Boyce Avenue à Jorge e Mateus. O tempo está favorável; os últimos raios de sol já se foram, e as primeiras estrelas no céu indicam que não haverá chuva esta noite. Isso é muito bom, afinal, ele pretende levar Bruna a um passeio que envolve um céu estrelado, duas taças ao lado, e uma noite á desvendar.

Do outro lado da rua Bruna aguarda o semáforo fechar para atravessar tranquila. É hora de pico, e por isso, não é muito fácil chegar onde Leonardo está. Ela masca chiclete e fala ao celular, enquanto o vento traz seu cabelo loiro platinado para à frente do rosto. Os dedos cobertos de anéis prateados combinam com a calça jeans rasgada, a blusa branca e o colete preto. Quando chega até onde está o namorado, o dá um beijo rápido, um sorriso, e volta à sua ligação. Ao terminar, já sentado no carro, bufa e diz “nossa, estou tão cansada. Só quero um banho e um edredom”.

É estranho e triste perceber, mas isso quase é capaz de murchar as flores que Leonardo deixou sob o painel do carro, na esperança de que ela as visse.

Somos gêmeos, virgem, áries e peixes. Somos médicos, publicitários, atendentes e pedreiros. Somos estudantes, bacharéis, mestres e doutores. Somos rock, samba, rap e bossa. Somos homens e mulheres que carregam em si as muitas diferenças trazidas pela formação de nossa identidade.

Eu mesma que aqui nestas linhas transmito um pouco de meu sentimento, sou diferente de você que aí de onde está lê meus sorrisos, olhares e devaneios.

E são tão lindas nossas diferenças, não? Já pensou um mundo todo vermelho? Ou ter apenas sorvete de banana como opção na hora do jantar? O que nos torna quem somos são as escolhas que fazemos ao longo do caminho e o pouco de nós que deixamos a cada esquina cruzada.

Mas nossas diferenças não se limitam apenas a religião, time de futebol e marca do celular; não, muito pelo contrário, nossas diferenças se estendem a comportamentos, reações e interações.

Como humanos, desenvolvemos aproximações, que mais tarde tornam-se laços, e posteriormente, relacionamentos. E é nesses relacionamentos – principalmente nos amorosos – que identificamos mais de nós, e muito mais ainda do outro. Há os que são como fogo; quentes, fervendo em si, à procura de alguém para juntos incendiar toda uma floresta e apreciar a beleza das chamas de uma incontrolável paixão. E há quem assim como a água está sempre em movimento, num constante vai-e-vem que ora é a calma da maresia arrastada pela brisa, e ora é o agito das ondas formadas pelo vento.

Há ainda os que nasceram da terra firme, constante, centrado em si e no mundo. E da mesma forma há os filhos do vento, livres, desprendidos de qualquer outro fator, indo de lá para cá em segundos, sem dar muita atenção ao seu redor.

Leia Mais: Deixe-se amar por quem você é

E em cada relacionamento as pessoas serão isso: diferenças que se encontraram numa linha tênue chamada amor e decidiram caminhar juntas, mesmo sabendo que a qualquer instante pode-se cambalear e até mesmo cair. Porém, se cair, não cairão sozinhas; haverá o outro para firmar tudo e criar solo até mesmo onde não houver nada.

Há quem deseje infinitamente ser levado à restaurantes caros, viagens para o exterior com direito à muitas fotos, lives e um retorno triunfal com uma surpresa no aeroporto, e também há os que se satisfazem com um livro, um café quente e uma vista para apreciar. Há quem tenha o casamento planejado desde os 13 anos, com a idealização perfeita do vestido das 42 madrinhas, um cardápio farto em carnes e vinhos nobres e uma invejável iluminação, e há quem anseie apenas por uma troca de alianças durante um jantar com amigos e familiares cercando a mesa.

O que estou dizendo é que cada pessoa vive num ritmo diferente da outra, mas isso não é motivo para se sentir menos amado. Não é por que o Luís trouxe um sonho de valsa ao invés de um anel Tiffany&Co que ele não te ame. Talvez a Ana não tenha lhe feito uma declaração de amor no Facebook por considerar o abraço dado pessoalmente mais importante que um texto com 100 curtidas.

Por vezes é difícil acreditar no sentimento do outro, principalmente quando você é maremoto e sua companhia, garoa fina. Quando se é intenso feito o perfume da dama-da-noite em flor, espera-se que o outro proporcione de volta toda a intensidade oferecida, mas nem sempre isso irá ocorrer, e não é porque seu parceiro ou parceira não quer, é apenas porque a forma de amar de cada um de nós é diferente da forma do outro.

Não desperdice o amor que está em suas mãos. Não perca nem um minuto se quer das pequenas e ao mesmo tempo tão grandes demonstrações de carinho que lhe são dadas. E essas demonstrações são mínimas e também enormes, pois elas vêm quando você menos espera, e isso é o que faz valer à pena. À noite, enquanto assistem a um filme e de repente seus braços ficam imóveis ao ser envoltos por um abraço quente. Ou no almoço, quando de repente você percebe que bem, aquela pessoa está te olhando, ou melhor, está lhe enxergando, e seus olhos sorriem um para o outro.

E esses momentos, tão puros, tão desavisados que acontecem como um passe de mágica, são a prova viva de que sim, ali há amor, um amor sem excessos, sem gritos, sem textões, sem eventos e cerimônias, mas com muita firmeza, raízes profundas e reciprocidade.

Aproveite esse amor diferente do seu para aprender a ser mais naquilo que aparenta ser menos. Deixe de buscar motivos para o término e encontre todos os dias motivos para reinício. Contente-se em ter ao seu lado segurança e certeza, e saiba que tendo você por perto, esse alguém é feliz em receber excessos e intensidade.

Raquel Gonçalves

Há quem diga que os olhos são a janela da alma, então, no meu caso, eles são uma janela bem grande e aberta. Amante das artes, do universo e das palavras, necessito de música para viver, dos astros e estrelas para pulsar e dos versos para existir. A publicidade me escolheu; por isso anuncio paz, promovo sorrisos e transmito intensidade. Sou colunista do Fãs da Psicanálise.

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Raquel Gonçalves

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