A dimensão da existência humana vai muito além daquilo que podemos sentir ou mensurar, tampouco compreender. Não à toa Drummond nos diz que no seu coração sequer cabem as suas dores. A nossa finitude e incapacidade para entender aquilo que acontece, na maior parte das vezes, nos paralisa e nos coloca diante do traço trágico que nos forma, como se não houvesse saída, ou não houvesse tempo o suficiente para que possamos chorar nossas lágrimas.
Quando estamos dentro do furacão ou diante das tantas travessias a que temos que passar, tendemos a esquecer que a vida também é constituída por transições, ciclos, mudanças a que temos que passar a fim de que possamos crescer e tornar-se algo mais próximo daquilo que realmente somos. São as longas e silenciosas metamorfoses da vida, como falou Rubem Alves, e sem as quais continuamos a ser lagartas ou borboletas sempre com as mesmas cores.
Evidentemente, até pela nossa condição humana de finitude e, consequentemente, incapacidade de apreender tudo aquilo que nos forma (interna e externamente), sentimos enorme dificuldade em passar por esses momentos, o que em alguns casos pode ser até mais desesperador, com o desenvolvimento de problemas graves, como a ansiedade e a depressão.
No entanto, é preciso que busquemos perceber que grandes coisas surgem de momentos de conflito e que se estamos sob a ação de um tempo que não conseguimos controlar, não há como lutar contra ele, tentando se apegar a momentos que já não existem ou forçosamente querendo chegar a lugares futuros. É necessário aprender a conviver com esse tempo, sabendo que as quedas fazem parte da vida, assim como as transformações que delas decorrem.
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Dito de outro modo, precisamos – como versa o poema da Cecília Meireles – aprender com a primavera a deixar-nos cortar para que possamos voltar sempre inteiros, já que, ainda que não percebamos, sempre há galhos que precisam ser podados ou retirados para que novos ramos possam crescer. É como na estória do Pequeno Príncipe, em que a rosa diz para o principezinho que precisa suportar duas ou três larvas se quiser conhecer as borboletas.
A bem da verdade, sabemos o quanto é difícil suportar essas “larvas”, afinal, somos tão pequenos diante da imensidão do universo. Entretanto, é nesse mesmo universo que habitamos, onde a dor e o sofrimento se fazem presentes, que também se esconde a inexplicável poesia da vida, a que encontramos se soubermos olhar. Sendo assim, em cada travessia que fazemos se esconde uma transformação, pois para cada coisa que morre, há sempre outra que nasce, já que “devemos morrer para uma vida, antes que possamos entrar em outra”.
Dessa forma, somos como rios que vão fluindo, reconstruindo-nos de modo diferente a cada tempestade que nos abate, pois somos seres transitórios e é nessa transitoriedade que nos encontramos. Por isso, lembrando mais uma vez Cecília – “A vida só é possível reinventada” – para que a cada estação possamos experimentar o vento com um novo gosto e lavar nossa alma com uma nova luz.
(Foto: Brooke Shaden)
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