Irmão de Sangue (Blood Brother – 2013)

Rocky Braat foi para a Índia como um simples turista. Quando conheceu um grupo de crianças com HIV, decidiu ficar. Ele nunca poderia imaginar os obstáculos que enfrentaria ou o amor que iria encontrar.

Este belíssimo filme venceu o prêmio principal de público e crítica no Festival de Sundance, mas, após cinco anos, infelizmente segue desconhecido por aqui. A realidade é que o brasileiro, em geral, não valoriza documentários (e, no tocante a premiações, só dedica atenção àquela bobagem brega do Oscar). Revi para a preparação deste texto e fiquei impressionado em perceber que a força dele segue intacta.

Alguns críticos estrangeiros apedrejaram a obra com acusações de que não passava de uma egotrip do protagonista, tremendo exagero, equívoco grosseiro. É, sim, uma declaração de amor entre amigos, o diretor Steve Hoover decidiu tentar compreender melhor a missão de Rocky, já que o rapaz havia abandonado uma vida confortável nos Estados Unidos para, com total consciência do fardo, enfrentar diariamente as maiores pressões físicas e psicológicas na Índia. E o próprio afirma que sequer gostava muito de crianças, até encontrar aqueles sorrisos encantadores naqueles corpos tão frágeis.

A sua câmera tenta analisar as incríveis mudanças internas na pessoa que ele acreditou que conhecia tão bem. Exatamente por ser essencialmente um retrato específico de um indivíduo, não apenas um panorama geral sobre o contexto em que ele está inserido, o filme se torna relevante intelectualmente, ao invés de apelar somente para o emocional, elemento mais óbvio que o tema suscita.

O contraste cultural pesa nos ombros do rapaz. É tocante a cena em que vemos ele destroçado por ser culpabilizado pela morte de uma menina, já que ele, acompanhado do pai dela, decidiu buscar atendimento médico, tirando ela do templo religioso. A sociedade, cega em suas convicções espirituais, acreditava que a cura pela oração era o único caminho. Em outro momento poderoso do filme, acompanhamos o amor que o pequeno Surya nutre pelo “irmão” norte-americano, sentimento capaz de operar verdadeiro milagre, contra todas as probabilidades, quando até mesmo os médicos já haviam perdido a esperança.

Quando Rocky afirma que “toda criança sente a necessidade de pertencer a uma família”, o documentário evidencia que o próprio homenageado sofre com isto, já que seu pai, entrevistado logo no início, exibe revoltante preconceito, ignorando o valor nas ações do filho. Ao dar as costas para uma carreira financeiramente estável, o jovem se distanciou dos anseios parentais.

“Irmão de Sangue” comprova que precisamos lutar pelos ideais em que acreditamos. Trilhar os rituais vazios apenas para satisfazer outrem é um desperdício de vida. A sabedoria mais preciosa nasce da boca de uma pequena indiana que encontra ternura no caos: “Amar é levar alegria para alguém que está triste”.

Um dos melhores documentários que já vi, excelente em tudo aquilo que se propõe a abordar. Veja e renove sua esperança na humanidade.

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Octavio Caruso é escritor, crítico de cinema, ator, roteirista e cineasta independente. É colunista do site Fãs da Psicanálise.

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