Os resultados sublinham a importância da Psicoterapia para a redução do período de sofrimento e/ou evitar que sintomas se tornem crônicos – uma vez que o grupo 2 de policiais não submetidos à Psicoterapia continuou a apresentar os mesmos sintomas, com sinais de piora, enquanto os policiais submetidos à Psicoterapia apresentaram uma redução de pelo menos 37% nos escores totais da Escala de Avaliação Clínica (CAPS).
A caracterização de um evento como traumático também depende do processamento perceptual de cada indivíduo.
Tradução do indescritível
Aprender a falar é aprender a traduzir. Talvez, o que aprendemos nos primeiros dois anos de vida seja mais importante que todo o conhecimento reunido ao longo de uma extensa formação acadêmica. As palavras são os veículos para o processamento relacionado com a atribuição de significados aos acontecimentos passados. Ainda que a palavra não seja a única via para a comunicação, certamente é uma das mais usadas no contexto terapêutico. Por meio da palavra, a Psicoterapia favorece a conclusão do processamento de um passado traumático inacabado, libertando as pessoas para viverem no presente.
Os escores da Escala de Impacto do Evento do grupo 1, após a Psicoterapia, revelaram que o evento traumático era menos impactante em comparação com os escores pré-Psicoterapia. A Psicoterapia favoreceu o desenvolvimento da resiliência e ajudou a reduzir significativamente os sintomas pós-traumáticos. À medida que a classificação cognitiva (narrativa) se desenvolve, as expressões fragmentadas sensoriais e emocionais (característica do trauma) diminuem.
A homogeneidade da amostra estudada influenciou os achados neurais precisamente demarcados quanto às correlações neurais envolvidas na melhora sintomatológica dos policiais com TEPTp: os escores CAPS e as pontuações do Inventário de Memórias Traumáticas (IMT) quanto à modalidade narrativa melhoraram conforme maior atividade do córtex médio pré-frontal e menor atividade da amígdala. Em outras palavras, observamos que novas classificações e traços de memória se formaram, substituindo as conexões neurais anteriores envolvidas com o sofrimento. Essa evidência reforça a importância de reclassificar e aprender com a dificuldade, em vez de sucumbir a ela.
Resiliência
As pessoas que inicialmente configuram o TEPTp podem desenvolver o TEPT crônico, que apresenta risco três vezes maior para manifestação de comorbidades como transtorno depressivo, transtorno somatoforme e transtorno do pânico. As dores crônicas são também possíveis comorbidades decorrentes dos traumas psicológicos e esta relação é ainda pouco conhecida. Por isso, recentemente publicamos as associações significativas entre TEPT e dores crônicas (cefaléia e fibromialgia) no Current Pain Headache Repport. Os preditivos de resiliência mais importantes foram a autoeficácia (confiança em si), a empatia e o otimismo. O binômio flexibilidade emocional e reservas cognitivas se mostrou como um mecanismo subjacente à capacidade dos policiais resilientes de adaptação bem sucedida a ambientes/condições com potencial traumático.
A religiosidade teve um papel ativo na resiliência conforme a escala Durel e RCOPE. Dois principais fatores de enfrentamento religioso mostraram destacada significância: “busquei o amor e o cuidado de Deus” (procura de apoio espiritual) e “eu procurei colocar meus planos em ação junto com Deus” (enfrentamento religioso colaborativo). Tais reservas cognitivas podem ter influenciado o manejo do evento traumático bem-sucedido.
Os conhecimentos adquiridos durante o processo terapêutico beneficiarão também outros domínios da vida, podendo melhorar, por exemplo, a relação familiar e interpessoal, gratidão, bondade e amor A religiosidade mostrou um papel ativo e positivo na superação do trauma, sobretudo por conta do apoio espiritual e do enfrentamento religioso colaborativo Os resultados do estudo realizado com policiais traumatizados sublinham a importância da Psicoterapia para a redução do período de sofrimento e/ou evitar que sintomas se tornem crônicos.
Nossos dados mostraram que o córtex médio pré-frontal exerce um papel-chave no processo de aprendizagem e a terapia de exposição e reestruturação cognitiva pode influenciar o desenvolvimento de um padrão mais narrativo do trauma. As semelhanças entre o grupo 1 pós-Psicoterapia e o grupo 3 em relação à expressão neural e escores de sintomas mostram que a resiliência pode ser desenvolvida e a Psicoterapia pode favorecer este processo de aprendizagem. Futuras pesquisas podem direcionar as estratégias cognitivas que contribuem para melhorar as respostas à Psicoterapia.
PARA SABER MAIS
Inventário de Memórias Traumáticas
O Inventário de Memórias Traumáticas (IMT) foi usado para verificar e classificar as características básicas das memórias traumáticas, agradável e neutra. Os escores IMT mostraram que a recuperação da memória traumática esteve emocionalmente e sensorialmente menos intensa no grupo 1 após a Psicoterapia. O estudo revelou uma relação inversamente proporcional entre a expressão narrativa e a expressão sensorial/emocional do trauma.
Referências
Edição Especial de Comemoração dos 50 anos do Journal of Psychiatric Research: PERES JF, FOERSTER B, SANTANA LG, FEREIRA MD, NASELLO AG, SAVOIA M, MOREIRA-ALMEIDA A, LEDERMAN H. “Police officers under attack: resilience implications of an fMRI study”. J Psychiatric Res. 2011 Jun; 45(6):727-34.
PETERSON C, PARK N, POLE N, D’ANDREA W, SELIGMAN ME. “Strengths of character and posttraumatic growth”. Journal Trauma Stress. 2008 Apr; 21(2):214-7 www.traumaesuperacao.com.br
(Fonte: Revista Psiqué, através: psicologiasdobrasil.com.br)