Criança

Fim das férias escolares: refletindo e acolhendo possíveis angústias

Períodos de férias e ócio são importantes para o desenvolvimento emocional das crianças, pois oportunizam o brincar, a criação e estimulam a imaginação. As férias escolares são ótimas oportunidades para potencializar ainda mais a criação, imaginação, o simples brincar com liberdade.

A criança cria sua personalidade a partir do mundo externo, e ela faz isso através do brincar, que deve ser investido não apenas no período de férias, mas sempre. O ambiente, os cuidadores principais da criança, devem proporcionar momentos em que o brincar possa acontecer sem regras, compromissos ou predeterminações.

Assim como as férias escolares, o início ou retorno para a escola cedo ou tarde acontecerá e é uma realidade nem sempre vivida como prazerosa, seja pelos pais ou pelos pequenos.

Para que os pais consigam enfrentar esse momento de desligamento de modo tranquilo é interessante se conscientizar da função que a escola cumpre para o desenvolvimento infantil e a necessidade de deixar os filhos saírem do aconchegante e seguro ninho familiar. Assim como considerava Winnicott, pediatra e psicanalista inglês, o papel da família é se tornar gradualmente menos essencial à medida que o tempo vai passando.

A escola é responsável pela transmissão da cultura, dos conhecimentos científicos, ela tem a função de potencializar novas criações a fim de continuar o progresso científico e humano. Inevitavelmente, a escola também oferece um importante local para que as primeiras oportunidades da construção de vínculos sociais fora da família sejam vividas. Isso é importante e interessante, pois nem sempre os pais estarão por perto quando necessários e as crianças ou adolescentes precisam estar preparados para, aos poucos, caminhar também com os próprios pés, na convivência em grupo.

No que se refere a possíveis dificuldades das crianças no início ou volta às aulas, acolher e compreender os sentimentos dos pequenos é a grande chave para resolução de qualquer potencial conflito. É muito importante conversar, perguntar, perceber na brincadeira as possíveis angústias das crianças.

Após tanto tempo em casa, algumas crianças podem ter certa resistência na mudança da rotina. É preciso compreender qual o desencadeador dessa resistência. Talvez ela esteja fantasiando que algo negativo possa acontecer, com medo de possíveis mudanças nos horários, troca de professores, troca de turma ou modificações do grupo de amigos, etc.
Seja qual for o problema, ele só poderá ser solucionado quando for entendido. Negar, mentir ou enganar a criança nunca é um caminho indicado, ao invés disso os pais devem mostrar que temer é natural, se angustiar é natural, provavelmente os próprios pais já passaram pelos mesmos sentimentos e podem, então, acalmar a criança, esclarecer suas dúvidas e ajudá-las a enfrentar seus medos e dificuldades. Enfrentar é o oposto de negar o problema.

A Família deve construir uma parceria com a escola e também com o Estado. Cada um com uma função específica no desenvolvimento das crianças, mas complementares.

A família deve estar sempre presente, auxiliando as crianças no desenvolvimento das tarefas de casa, oferecendo as condições apropriadas e um ambiente adequado para que a criança possa estudar e se desenvolver. A tarefa mais difícil da família talvez seja justamente essa, pois requer o oferecimento de um ambiente de estabilidade emocional, afetuoso e cuidadoso, sem exageros e superproteções.

Além dessas condições, algumas outras também precisam ser supridas e aqui entra o papel do Estado em assegurar desde as mais básicas como alimentação, higiene, vestuário, saúde, lazer, cultura, ambiente físico, material escolar, etc.

Uma sociedade que investe no conhecimento e que tem nas relações humanas sua estrutura, se desenvolve, tem menos chances de errar e quando erra sabe aproveitar do erro para crescer. Sem a educação nada disso é possível.

Tudo o que foi dito aqui pode ser resumido em algo muito simples, mas muito complexo ao mesmo tempo: seja durante as férias ou no período escolar, precisamos oferecer cuidado, afeto e deixar que as crianças sejam crianças, brinquem, criem, caiam e aprenderam a levantar. Legitimar a criatividade própria das crianças é legitimar sua entrada no mundo e possibilitar que essa criatividade recrie o mundo, tornando-o um melhor lugar para se viver com o passar das gerações.

João Paulo Zerbinati

Psicólogo clínico de orientação psicanalítica, atendendo em Itápolis-SP e Ribeirão Preto-SP. Graduado pela PUC (2014). Mestre pela UNESP (2017). Pesquisador membro do grupo de pesquisa SexualidadeVida USP\CNPq. É colunista do site Fãs da Psicanálise.

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João Paulo Zerbinati

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