Família

Famílias despedaçadas

“De pai saí como um mero parente distante”. A declaração melancólica e o sentimento de descontentamento de Luís (nome fictício), 34 anos, foi dada quando se viu privado da convivência dos filhos pelo tribunal de sua ex-companheira Lucia (nome fictício), de 30 anos.

Após doze anos de relação estável morando em Rio Preto, o casal se separou e a ex-esposa, que ficou com a guarda dos filhos, Daniela, de 10 anos, Lucas, de seis, e Letícia, de três anos, mudou-se para Goiânia. Entretanto, o direito de Luis, de viver separado apenas de sua ex-cônjuge, mas não dos filhos, não foi aceita por Lucia. A ex-mulher inventou inúmeras histórias contra o ex-marido e programou seus filhos para que depois da separação, eles odiassem o pai. Resultado: dez anos longe dos pequenos.

A história de Luís e sua família é tão grave quanto antiga e habitual. É comum encontrar pai ou mãe que dificulta o contato da criança com o ex-parceiro, fala mal, conta mentiras ou até estimula que a criança sofreu violência para afastá-lo do ex-cônjuge. E as principais conseqüências? O filho permanece anos afastado do pai ou da mãe, tempo suficiente para que os vínculos sejam partidos. A expressão alienação parental, criada em 1985, nos Estados Unidos, pelo psicanalista Richard Gardner, explica a pratica.

É uma velha conhecida da psicanálise e revela como o mal impede o desenvolvimento das relações. “Uma prisão que, repleta de culpas, chantagens, impede o crescimento pessoal, afetando diretamente a formação e o desenvolvimento da própria personalidade”, afirma o psicólogo e psicoterapeuta Prof. Renato Dias Martino.

Entretanto, o equilíbrio emocional da criança, é esquecido por aquele que mente e calunia o ex-parceiro. Quando há falsa acusação, esses erros comportamentais, seja do pai ou da mãe, surtem uma porcentagem alta de interferência no desenvolvimento da criança. “Quando se pensa em jogo baixo, envolvendo fatores emocionais, isso inevitavelmente nos remete à construção de vínculos perversos entre pessoas”, afirma Prof. Martino.

Na avaliação dessa situação, é importante pensar como pode ter sido a construção e em que estágio de desenvolvimento pode se encontrar a capacidade de viver relações reais. “Assim, o caso de Luís expõe que quando uma das partes se sente injustiçada, de alguma forma, pode se utilizar de recursos baixos como esse, justamente para aliviar a sensação de estar sendo lesada. Na medida em que se é capaz de estabelecer vínculos mais sadios com o mundo, abre-se mão por meio de certa tolerância, da urgência de se livrar de sentimentos indesejados e se estabelece assim, o que poderíamos descrever como vínculos reais.”

Mas então como descobrir os indícios que está sofrendo da alienação parental? A psicóloga Maria de Lourdes Prado cita três casos: quando o pai ou mãe não encontra os filhos em casa no dia de visita, a criança não atende seus telefonemas e quando o filho muda seu comportamento na presença do ex-parceiro.

Leia Mais: Alienação parental é traumática para crianças pequenas

No âmbito psicológico, para remendar os laços partidos, um pai ou mãe deve se inundar de afeto e sinceridade para que o filho não sofra com a atitude do ex-parceiro. “A verdade é sempre o bálsamo benigno para qualquer que seja a questão psicológica. A verdade é o alimento da alma, e sem ela a alma definha. Um ambiente cheio de amor e verdade é o único meio seguro para lidar com questões sérias como essa”, afirma Prof. Martino.

Quando constatada tal condição, o lesado também pode recorrer a profissionais especializados neste tipo de problema como mediadores, psicólogos de família, além de pessoal da área jurídica (família/mediação) e outros, devidamente preparados e com métodos e técnicas que podem facilitar este processo que vive o casal. “Tal assessoria pode economizar dinheiro, e o mais importante, desgastes e estresse no relacionamento, com conseqüências desfavoráveis principalmente para os filhos”, afirma o psicólogo da Famerp, Nelson Iguimar Valério.

Sinceridade pode salvar as relações. A sinceridade é algo muito interessante, pois transcende a racionalidade. Já a mentira, como o próprio ditado diz, tem perna curta. Então, o pai ou mãe que manipula afastar o ex-parceiro dos filhos pode “estar cavando seu próprio túmulo”, como um outro ditado diz.

Com o tempo as crianças crescem e começam a entender o que ocorre ao redor delas. De acordo com o psicólogo e psicoterapeuta Prof. Renato Dias Martino, quando isso acontece é um ótimo sinal. Uma notícia de que houve um reconhecimento da violência psicológica e inicia-se aí uma luta no sentido da renúncia do vinculo perverso.

Entretanto, infelizmente, na maioria dos casos a dependência se instala de uma forma tão simbiótica que dificulta certa tomada de consciência da situação e a submissão afetiva é remontada de forma patológica por muitos anos. “A dissolução do vínculo primário é naturalmente a tarefa mais pesada e dolorosa das transformações emocionais e com o agravante da manipulação; libertar-se disso torna-se um verdadeiro ato heroico para consigo mesmo.” Por outro lado, professor Martino afirma que nunca é tarde para se propor uma vinculação regida pela sinceridade. Nenhum mal resiste à tentativa da introdução da verdade, quando é feita com afeto. “O quanto antes a proposta da verdade surgir, tanto antes a transformação do vínculo acontecerá.”

Cuidados: O ideal quando um casal com filhos decide se separar é que haja respeito, responsabilidade, diálogo e principalmente manutenção dos limites aos filhos de maneira conjunta. “Os casais em processo de separação devem buscar ajuda para que possam se orientar melhor. É uma nova realidade que precisará se desenvolver, para que todos possam se reposicionar e seguir em frente, minimizando desgastes”, afirma a psicóloga Irene Araújo Corrêa.

(Autor: Prof. Renato Dias Martino)

(Fonte: pensar-seasi-mesmo)

*Texto publicado com autorização do autor.

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