Comportamento

DESCULPE, MAS CASAMENTO NÃO VEM COM DISPOSITIVO ANTIBRIGA

Desafio você a me dar um exemplo de um único padrão de relacionamento em que não haja conflitos.

Pai & filho? Nem pensar! Irmãos? Menos! Bom, toda família tem suas discussões, então passemos a outra área… Amigos? Colegas de escola, trabalho? Chefes? Clientes? Irmãos da igreja? Sócios? O motorista ao lado? Não, impossível. Uma hora ou outra, sempre aparece um bate-boca aqui, outro acolá. Nada sério, mas acontece.

E por que você acha que seria diferente com seu par? O que teria de específico um relacionamento amoroso (termo meio impróprio, porque amorosos são todos os bons relacionamentos) para tornas inadequadas, impróprias, pecaminosas até, as brigas e discussões?

Bom, que um casamento tem suas especificidades, todo mundo sabe. Mas, lamento dizer, nenhuma delas foi projetada para abafar os conflitos. Não há num relacionamento afetivo-sexual qualquer dispositivo “antibriga”.

Leia mais: Relações

E a razão para isso é simples: um casamento – ou namoro, ou qualquer outro nome que se dê – é uma relação entre indivíduos e, como tal, implica, a um só tempo, um choque de egos e diferenças.

Muitas vezes, felizmente, esse choque é resolvido pela conversa; noutras, mais raras, um dos dois (ou três – alô, poliamor!) acaba cedendo, abafando seus pontos-de-vista ou opiniões. Mas sempre haverá as ocasiões em que nenhum arredará o pé e, com as paixões humanas à flor da pele, escalarão os atritos até chegar à discussão.

Leia mais: Relacionamentos deveriam começar de trás para frente

Não, cara(o) amiga(o), não sou adepto do entre-tapas-e-beijos. Longe de mim! Acho odiosa qualquer tipo de violência. Não é disso que se trata.

Mas, pense comigo: não seria um bom começo reconhecer que as discussões são uma parte inescapável dos relacionamentos e, a partir daí, saber usá-las a seu favor, como uma forma saudável de melhor conhecer o outro, não apenas por meio daquilo que nos une, mas, também, do que nos separa? Afinal de contas, não há no universo alma tão gêmea à nossa que não guarde ao menos uma diferença, por ínfima que seja, em relação àquilo que somos e pensamos.

Há algum tempo, ouvi de uma amiga terapeuta que o tipo mais perigoso de casal é aquele que chega ao consultório e, de peito estufado, vai logo anunciando: “a gente se dá tão bem que nunca briga!”

Leia mais: “O casal perfeito” – Lya Luft

Demorei um pouco para entender a razão do comentário, mas percebi que uma frase assim mal consegue disfarçar um relacionamento fracassado, porque, das duas, uma: ou perdeu-se o interesse mútuo, ou uma das partes não está disposta a dar a conhecer suas ideias, vontades, opiniões, desavenças – o que, no fundo no fundo, dá no mesmo.

Quer algo mais prático? Pense na última discussão que teve com seu/sua parceiro(a). Aposto com você que, se parar para enxergar os porquês, vai descobrir que ali tem um profundo interesse seu, ou dele(a), em vocês dois (três, quatro, não importa).

Foi porque ele esqueceu o aniversário do primeiro beijo? Foi porque ela te deu um chá de cadeira para se arrumar e fez vocês perderem o melhor da noite? Foi porque ela não cortou com rispidez a cantada sem vergonha do colega de faculdade? Foi porque ele ficou até tarde no trabalho e a macarronada que você preparou esfriou? Foi porque ele não defendeu você na frente da mãe dele?

Leia mais: Como você lida com aquilo que não controla?

Não sei. Mas, puxe pela memória e analise com mais calma. Você vai descobrir que por trás de suas brigas (ou, queira Deus, boa parte delas) está o amor que sentem.

Mas, se Deus não quis, é porque certamente não estamos falando de uma discussão saudável. E o problema, aí, não é a discussão, mas o próprio relacionamento.

Sabe aquela história mal contada de revista “o casamento está em crise? Leve o gato para uma pousada para um fim de semana de sexo incrível”? Pois é, lamento dizer, mas é balela. Sexo não resolve crise, e discussão muito menos.

Leia mais: Relacionamentos: “meu casamento não é mais o mesmo”

Agora, se vocês têm um relacionamento excelente, mas, vira-e-mexe, se envolvem em briguinhas ou discussões que põem vocês de cara amarrada um com o outro, está tudo bem com vocês! Nada com que se preocupar.

E da próxima vez que fizerem as pazes, que tal, em vez de trocarem juras de “nunca mais vamos brigar, tá, amor?”, tentarem algo mais realista, mas não menos romântico, como “obrigado por ter brigado como alguém que realmente me

Fábio Simão Alves

Diplomata e colunista do site Fãs da Psicanálise

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  • Gostei do tema mas não da afronta. Meu relacionamento com minha esposa é sem brigas, ou seja, acho que a pesquisa só contempla os brigoes. Nada escondo e tudo conversamos. Acho meio difícil a gente brigar. Quanto aos outros relacionamentos, sim, há um jogo de conflitos.

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Fábio Simão Alves

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