Teatro e psicanálise se encontram no silêncio. Entre silêncio da vida e o silêncio da morte, a existência se dá entre muitos encontros e desencontros. Teatro é encontro, encontro entre pessoas e das artes. É no teatro que todas as artes se reúnem, onde a música dá o ritmo da peça, a poesia e literatura criam a dramaturgia, a interpretação dos atores encanta o público e, com toque final, as artes plásticas promovem as cores e formas desde o cenário até às máscaras dos atores.
Diante de todas essas artes envolvidas no palco, talvez o tempero precioso, aquilo que une e reúne todas as artes e encontros, seja nada menos que a arte do silêncio. Os atores bem sabem da importância da escuta atenta e sensível no momento em que a fala entra,rompe com o silêncio e algo verdadeiramente acontece. Não basta decorar as falas, ensaiar e entrar na hora certa, os amantes do palco precisam desenvolver a difícil arte do encontro com o outro. Aqui, o público também está convidado a participar do silêncio compartilhado em que torna possível a potência do encontro.
Shakespeare bem disse que o teatro são os espelhos da vida, nos lembrando que teatro é a arte do efêmero. E na nossa difícil tarefa de nos desprender das armadilhas do passado e viver com menos excesso de futuro, o presente é o que temos de mais precioso, o único lugar onde é possível compartilhar experiências com os outros. Nos modificamos a cada encontro, um pouco do outro fica em nós e também um pedacinho nosso gruda no outro alguém. Não saímos os mesmos depois de um encontro verdadeiro e o teatro está lá para nos lembrar que é possível compartilhar a experiência de SER.
O desafio de repetir a mesma peça sem cair no tédio faz parte da arte se renovar e descobrir sentidos a cada encontro, desvendando as camadas das palavras, das ações e brincando nesse movimento de ser e não-ser o mesmo. Assim, também é o encontro na clínica psicanalítica. Um encontro em que, como já disse Freud, repetimos, recordamos e elaboramos nossas questões mais íntimas. A caminhada é longa, repleta de descobertas de quem realmente somos, o que queremos e qual sentido de nossas escolhas. Improvisações, humor e brincadeiras não ficam de fora desse caminhar que aproximam o lado cômico e trágico de ser quem se é.
Penso que o teatro e a psicanálise se aproximam com artes do encontro e do silêncio. Na busca por brechas do Inconsciente que se revelam no não-dito, nos sintomas, nos atos falhos e, claro, nos sonhos, a experiência de análise acontece, justamente, no sonhar junto.Aqui, encarar o não-saber é fazer psicanálise, se permitindo se re(descobrir) de muitos modos diferentes de ser.
A experiência do encontro entre paciente e analista, no aqui e do agora, atualiza uma relação de amor infantil que só pode ser vivida no presente, possibilitando que algo aconteça e se transforme.Assim, o silêncio, as pausas e o não-saber são os ingredientes que tornam não somente a analise, como também o teatro, artes do efêmero e de um dos mais preciosos encontros que podemos ter ao longo de nossa existência.
(Autora: Fernanda Fazzio é psicóloga, psicanalista e escritora.)
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