Categories: Adolescência

Aqui jaz…

Feliz Ano Novo! Embora janeiro já tenha chegado ao fim e o Carnaval seja passado, nunca é tarde para desejar aos leitores tudo de bom em 2016… muita luz, muita força, muita paz, muito sucesso, muito amor… muito tudo de bom e acima de tudo, muuuuita paciência e resignação diante daquilo que não acontecer como se quer ou se espera! Que neste ano possamos entender e exercitar as máximas “Não espere nada de ninguém e, ao mesmo tempo, espere tudo de todo mundo” e “Nesta vida, a dor é obrigatória, mas o sofrimento é opcional!”, assim, não nos magoaremos, não nos frustraremos e vivenciaremos o sofrimento na dose certa!

O primeiro texto do ano traz um assunto urgente e delicado e que serve de alerta a pais e educadores. Vamos conversar um pouquinho sobre suicídio na adolescência.

Segundo pesquisas recentes, a cada ano, 102 adolescentes entre 10 e 14 anos cometem suicídio no Brasil. Estes dados fazem parte das estatísticas oficiais, porém se pensarmos que muitos casos sequer chegam até os hospitais ou autoridades policiais, estes números podem ser muito maiores.

Há dois casos que me chamaram muito atenção ao fazer uma rápida busca na internet.

Um caso é de um adolescente brasileiro de 16 anos e o outro de uma garota canadense de 15 anos.

Ambos tinham tudo que um adolescente pode querer: uma vida familiar estável, pais presentes,  eram bonitos, inteligentes, cultos e ambos foram vítimas de uma ferramenta que é ao mesmo tempo uma benção e uma maldição: a internet.

Vinícius Gageiro Marques morava no Rio Grande do Sul. Era considerado um garoto extremamente inteligente e sensível. Fazia acompanhamento com um analista e estava em internação domiciliar, pois o suicídio era tema recorrente em sua análise. O jovem simulou uma vida normal para os pais para poder ficar sozinho em casa e com a ajuda de internautas que lhe incentivaram e ensinaram algumas técnicas finalizou sua vida no banheiro de sua casa , com milhares de internautas acompanhando o suicídio em tempo real! Uma jovem canadense que algumas vezes cruzava com ele em salas de bate papo sobre música, tentou evitar o pior, ligando para a polícia do Canadá e o policial canadense ligou para a polícia federal brasileira e relatou o que estava acontecendo. Mesmo assim a tragédia não foi evitada.

Amanda Todd foi vítima da internet. Animada pelo pseudoanonimato da internet, ela certa vez mostrou as partes íntimas num grupo de bate papo. Foi o bastante para ter sua vida exposta e julgada nas redes sociais. Mudou de escola, ficou sem amigos, pediu socorro na internet, mas nada aliviou a vergonha causada por um ato cometido aos 12 anos, quando se expos pela primeira vez no cyber espaço. Após três anos e sem saber como retomar auto respeito e o respeito alheio, a jovem pôs fim à própria vida, enforcando-se em sua casa.

Ambos já haviam tentado se matar em outras oportunidades. Ambos buscaram ajuda psicológica. Ambos puseram fim à própria vida.

Passaram por momentos de angústia e depressão. Reclamavam da incompreensão, da solidão e da falta de respeito.

As tragédias destes dois jovens estão na internet e qualquer um que tiver interesse poderá acessá-las, conhecê-las e chocar-se com elas. Assim como estas, há muitas outras histórias de jovens que finalizaram suas vidas num momento de extrema tristeza, solidão e angústia. Eram pessoas que, apesar de ter o conforto material, não sentiam o conforto emocional.

Os especialistas apontam que os principais sintomas que um suicida apresenta são: apatia incomum, letargia, depressão, falta de apetite, insônia persistente, ansiedade ou angústia permanente. Alguns buscam alívio no uso abusivo de álcool, drogas ou remédios. A maioria apresenta grande impulsividade, agressividade, dificuldades de relacionamento e integração na família ou no grupo social, estão presentes o insucesso escolar repentino, o afastamento ou isolamento social e atitudes como despedir-se daqueles que amam, sem que haja qualquer motivo para isso.

As causas podem ser muitas: falta de perspectiva de vida, violência, depressão, bullying, ser portador de transtorno bipolar, por exemplo tornam o jovem mais vulnerável ao suicídio. Porém, acredito que, à exceção de transtornos neuroquímicos de origem genética (como a esquizofrenia ou o transtorno bipolar), a maioria das mortes por suicídio está relacionada à questões de baixa autoestima e de conflitos psíquicos relacionados  a um superego tirano e a um ego frágil, masoquista e com baixa auto estima.

A autoestima caracteriza-se pelo amor que desenvolvemos por nós mesmos. O ideal é que tenhamos uma autoestima estável, entendendo nossas limitações e negociando conosco as formas de superá-las. Autoestima estável está ligada a padrões de comportamento mais empáticos. Assim, quando nossa autoestima está estável, não nos comparamos, não nos magoamos, não nos frustramos e nem queremos agir de forma masoquista nos punindo.

Atentar contra a própria vida é uma forma de punição.

Punição para si mesmo, por estar aquém dos padrões de perfeição estabelecidos para si mesmo; padrões estes que geram uma insistente sensação de inadequação, de menos valia e de culpa.

O suicídio caracteriza a necessidade de auto punir-se por esta imperfeição e por esta culpa, necessidade esta gerada por um superego (juiz, censor) tirano, que cobra condutas do ego baseadas em rígidos padrões de  valores morais (ideal de ego) e de características de personalidade (ego ideal) desenvolvidas pelo indivíduo ao longo do seu processo educacional. Suicidar-se simboliza também uma punição para aqueles que desenvolveram no indivíduo este superego tirano que age por valores morais e idealizações muito rígidos. Ninguém se mata sem querer matar a outrem!

O suicida é alguém extremamente frágil emocionalmente. Sente-se fora de contexto neste mundo e não consegue viver nele, de modo que tirar a própria vida é a solução mais viável.

Não sabemos quem são nossos filhos… muitas vezes achamos que eles são projeções bem sucedidas de nós mesmos e acabamos por educá-los de modo a serem simplesmente o melhor dos melhores e geralmente não percebemos o tamanho da carga que colocamos nos ombros deles.

Este texto não intenciona esgotar o assunto, mas trazê-lo à tona para discutirmos como estamos educando nossos filhos. Nós os educamos para que sejam pessoas de bem, para que tenham valores morais empáticos, para que sejam capazes de fazer escolhas que levem a um padrão mínimo de felicidade e realização, para que tenham tolerância à frustração, para que aprendam a cair e levantar? Ou os educamos para serem a qualquer custo o máximo, o melhor, o mais perfeito, o que ganha sempre… simplesmente o sucesso em forma de ser humano?

Outro ponto importante é o poder de observação de um pai/uma mãe. A intuição… você tem usado estes poderes mágicos que todos os pais dedicados possuem?

Seu filho passa o dia na internet e você dá graças aos céus porque ele está seguro dentro da sua casa e você é um pai/mãe jovem, moderno e respeita a privacidade dele, não fica se intrometendo no que ele faz na net, afinal você não é da geração que nasceu no mundo virtual, nesse aspecto seu filho é seu professor. Além do mais você tem certeza que ele não fará nada errado, certo?

Nota zero para você! Você está pensando de modo ERRADO!!!!

A internet é um mundo onde tudo pode, tudo existe, de bom e de ruim e você como pai/mãe precisa ajudar seu filho a andar por estas terras nunca d’antes navegada.

Dois jovens que podiam ter tudo a ver com o seu filho perderam a vida navegando por este mundo de bênçãos e maldições.

Não seja invasivo, mas seja companheiro, esteja atendo e eduque.

Talvez se os pais de Amanda e Vinícius, tanto quanto os tantos outros pais não tivessem confiado tanto no poder de discernimento dos filhos, eles ainda estivessem por aqui… Ou não. Quem sabe?

Que fique o alerta!

Claudia Pedrozo

Professora, coordenadora pedagógica, diretora de escola e atualmente está na Supervisão de Ensino do Estado de SP. Pedagoga de formação, pós graduada em Gestão Escolar pela Unicamp, em Psicopedagogia pelo CEUNSP e formada Psicanálise Clinica. É colunista do site Fãs da Psicanálise.

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