“A liberdade é um fardo, porque ela implica um alto nível de responsabilidade nas escolhas que fazemos e gera uma série de incertezas sobre o que realmente desejamos. Não existe desejo que não implique em perdas. É muito mais fácil ser um objeto nas mãos dos outros, pois idealizamos isto como sendo nosso supremo conforto. Quando éramos crianças vivíamos cercados de pessoas nos dizendo o que pensar e o que fazer. Quando, finalmente, nos tornamos adultos, descobrimos que temos uma nostalgia da dependência”, Contardo Calligaris.
Cada vez mais nos submetemos aos fenômenos e aos comportamentos da lógica subjetiva. Nem sempre a carga de subjetividade que permeia um fenômeno ou um comportamento pode ser traduzida num direito do indivíduo de julgar e decidir por si só com relação ao próprio comportamento.
Bock, Furtado e Teixeira, apud França ( 2004, p.76), afirmam que “a subjetividade é a síntese singular e individual que cada um de nós vai construindo conforme vamos nos desenvolvendo e vivenciando as experiências da vida social e cultural”.
Essa síntese – a subjetividade – é o mundo de ideias, significados e emoções construídas internamente pelo sujeito a partir de suas relações sociais, de suas vivências e de sua constituição biológica; é, também, fonte de suas manifestações afetivas e comportamentais.
A nossa subjetividade, por paradoxal que pareça, talvez seja a mais social de todas as características humanas. Por isso, por mais que o “problema” possa parecer igual, a individualidade é que vai determinar o “tempo” de tratamento e a possibilidade de ressocialização de cada indivíduo, durante ou após permanência em unidade de tratamento para dependentes químicos.
Falo em singularidade com acompanhamento especializado, não como as medidas assistencialistas que vemos por aí. Elas podem e devem resolver os danos momentâneos. No entanto, segundo T. Coelho dos Santos e R. Amin de Freitas, na obra “Cartas de psicanálise”, é lançar o sujeito em outro desamparo: no do discurso homogeneizante e anônimo da ciência, para o qual tudo o que foi perdido pode ser sempre substituído. Trata-se de uma lógica quase indenizatória que tende a suprimir o aspecto trágico do dano irreparável. Não se repara a própria singularidade sem antes o sujeito passar por uma restauração interna.
Ela – a reinserção social – aparentemente tão individual e singular quanto o próprio paciente, só é válida enquanto puder ser social e diretamente ligada à sobrevivência do grupo social. Antes, desde o primeiro instante de um tratamento em comunidade terapêutica, é condição sine qua non a convivência entre os pares. Condição esta essencial para início dos trabalhos da ressocialização.
Para cumprir com o item XIII (atividades visando à reinserção social do residente), que está no parágrafo 1º do artigo 7º da RDC nº 29, imposta pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária, a equipe multidisciplinar de uma comunidade terapêutica deve levar em consideração a individualidade de cada interno.
É comum uma pessoa entrar para ressocialização antes de outras que já se encontram muito antes no tratamento. Vale lembrar que o esforço pessoal, seriedade, comprometimento,
tempo de uso da substância psicoativa, participação de familiares e amigos influencia na evolução do sujeito, bem como na avaliação da equipe.
Evitar situação de risco também é fator importante que vai determinar a reinserção social. Períodos festivos (como Natal, Ano Novo e Carnaval) não são adequados para o início de um programa de reinserção.
Claro que toda regra tem sua exceção. Vai depender de quanto à subjetividade de um tratamento, com regras objetivas, influenciou na singularidade do indivíduo disposto a retomar sua vida fora dos muros protegidos de uma instituição. Mas, lembre-se que toda caminhada começa com o primeiro passo. Devagar se vai ao longe e de volta à sociedade.
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