Por vezes, eu acho que é muito bom ser ridículo, por exemplo, num amor recém nascido, como é bom ser ridículo! Numa história fresca na nossa vida, como é importante a pieguice que nos baixa, o clichê das frases e das sensações tão antigas.

Como é bom sentir o universal friozinho na barriga e falar dele e senti-lo livremente. Como é bom o ‘boa noite amor’, o ‘eu te amo’ da madrugada, por mais batida e surrada que essa frase seja.

Como é bom se tornar o chato da turma, aquele que enquanto todos reclamam da política, do trânsito, da rotina, fica concordando com tudo e sorrindo, porque está vivendo o ridículo momento do passarinho verde.

Como é bom olhar a lua, sentir o vento, receber mais uma multa e achar que tudo bem, que tudo lindo! Ficar ouvindo 100 vezes a mesma mensagem de voz que não diz nada, mas faz cócegas na orelha. Como é bom começar a achar graça em tudo!

E quem nunca foi exageradamente ridículo numa dor de cotovelo? Quem nunca chorou cantando alto, achando que a música ‘Sozinho’ do Caetano Veloso foi feita exatamente pra você?

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Como é bom, apesar de depois acharmos feio e constrangedor, ser livre e abertamente ridículos, contar as dores de amor para a manicure, para a pessoa sentada ao lado no ônibus, para a outra ex-namorada que te entende tão bem, como é bom vomitar dores no ouvido do garçom!

Viver os momentos sendo assumidamente ridículo, até lavar a alma.

O ridículo enche nossas vidas, afinal o que seriam dessas rotinas insossas se não fossem os dramas mexicanos que nos inundam de enredos e histórias pra contar, que nos tornam interessantes para os nossos amigos, que nos fazem querer encher a cara e nos compartilhar?

O que seriam dos insípidos dias se não fosse o perfume doce e brega de uma paixão adolescente? E o que seriam das histórias de amor se não deixássemos nosso lado ridículo aflorar e alimentar uma energia boa que vibra na gente?

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O ridículo é semente, o ridículo é a desanestesia, é o acordar para sentimentos simples, mas que ainda me tocam, é perceber que ainda há tutano e energia vital por trás dessas minhas orgulhosas e imponentes cicatrizes.

Eu não tenho medo do ridículo, eu tenho medo das pessoas que, por pura escolha sensata, esqueceram como sê-lo.

Via nossa página parceira: clarabaccarin.com
Autor: Clara Baccarin
*Texto publicado com autorização da autora

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Clara Baccarin é paulista dos interiores, nascida nos anos 80. É escritora, poeta e agitadora cultural. Faz parte do grupo editorial Laranja Original. Publicou, pela editora Chiado, o romance poético Castelos Tropicais (2015) e a coletânea de poemas, pela editora Sempiterno (2016), Instruções para Lavar a Alma. Em 2017 lança, em parceria com músicos e compositores, o álbum Lavar a Alma, que reúne 13 de seus poemas musicados. É colunista do site Fãs da Psicanálise.

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