Nessa nova safra de produções de filmes e séries com a temática de contos de fadas, uma questão interessante se apresenta na forma de uma figura: A figura da bruxa!

Em todas as produções recentes, a bruxa, ou madrasta é sempre mais sedutora, mais interessante ou até mesmo mais bonita que a princesa.

E se observarmos os contos de fadas mais famosos, como Cinderela, Branca de Neve, Bela Adormecida, Rapunzel, a figura da bruxa está sempre presente. É uma figura que aparece repetidamente apenas mudando a roupagem.

Mas porque as bruxas seduzem tanto? Porque elas atraem tanto o nosso imaginário?

Para entendermos essa questão é importante atentarmos que se trata de um arquétipo. A bruxa/madrasta representa uma faceta do arquétipo da Grande Mãe.

No arquétipo da Grande Mãe estão inseridas a bruxa ou madrasta (a mãe diabólica, terrível), a velha sábia e a deusa que representa a fertilidade (aspectos da mãe boa).

A imagem da boa mãe representa tudo o que é belo e puro, já a mãe terrível representa aquilo que é ligado à destrutividade, à bruxaria e à animalidade.

Segundo Newman, em A Criança, o aspecto da Mãe Terrível liga-se à morte, ruína, aridez, penúria e esterilidade.

Infelizmente, com a cristianização de nossa sociedade, o aspecto diabólico da bruxa foi reprimido da imagem da Grande Mãe. Sua imagem se tornou unilateral, sendo a maior representante dessa imagem a Virgem Maria.

De acordo com Marie Louise Von-Franz, em A sombra e o mal nos contos de fadas, a bruxa é a Deusa-Mãe negligenciada, a Deusa da terra, a Deusa-Mãe em seu aspecto destrutivo.

Nisso percebe-se que todo o aspecto ctônico, toda sedução e sexualidade femininas foram suprimidas e associadas à imagem da bruxa, da feiticeira.

Entretanto, é um aspecto extremamente necessário para o desenvolvimento psicológico e para o processo de individuação.

Nos contos de fada citados, geralmente o pai (elemento masculino) é fraco ou inexistente, sendo somente redimido, após o enfrentamento da heroína com a bruxa, possibilitando a chegada do príncipe. E a mãe boa morre, dando lugar a bruxa ou madrasta, que passa a persegui-la e humilhá-la.

Entretanto, a bruxa é extremamente importante para o desenvolvimento da princesa. Sem ela não há narrativa, não há estória. Sem ela a princesa não sairia do lugar. Ela é uma força motriz que força a individuação.

Portanto, é a sombra da boa mãe negligenciada, que torna a heroína ou princesa tridimensional.

Em termos individuais a mãe terrível nos força a sair da zona de conforto. O ser humano sempre busca o prazer e o aconchego doa braços da boa mãe, e ele sempre tende a se tornar inerte nesse estado paradisíaco. Entretanto nele, não há desenvolvimento. Sem a mãe terrível para nos expulsar do paraíso não progrediríamos.

Ao aceitar o desconforto, o sofrimento e as limitações impostas pela bruxa, podemos nos desenvolver em direção a uma totalidade, capaz de integrar o bom e o ruim, o agradável e o desagradável.

Portanto, sem ela não podemos conhecer os opostos.

Além disso, a bruxa possui um caráter numinoso e por isso ela é fascinante. Ela á aterradora, pois pode manter a consciência em cativeiro, mas extremamente atraente.

Não é a toa que as produções de contos de fada hoje dão ênfase a esse personagem. Sua força enquanto mobilizadora do desenvolvimento é tremenda. Nossa consciência coletiva clama pela totalidade para que possamos dar um avanço em nosso processo de individuação e em nosso desenvolvimento coletivo.

(Autora: Hellen Reis Mourão,é analista Junguiana e especialista em Mitologia e Contos de Fadas.

Atua como psicoterapeuta, professora e palestrante de Psicologia Analítica em SP e RJ)

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Hellen Reis Mourão é analista Junguiana e especialista em Mitologia e Contos de Fadas. Atua como psicoterapeuta, professora e palestrante de Psicologia Analítica em SP e RJ. É colunista do site Fãs da Psicanálise.

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