Talvez você tenha em sua casa um livro de mesa do Vincent Van Gogh. Talvez você já tenha visto uma obra dele no museu. Talvez você, como eu, já tenha visto um par de turistas passar a mão num Van Gogh dos grandes museus de Nova York enquanto achavam que ninguém estava olhando.
Mas esse seu conhecimento faz de você um mero comedor de batatas comparado com a familiaridade de alguém que passou mais de meia década pesquisando no museu dedicado ao artista em sua obra, ou que a vida toda compartilhou o seu nome.
Como parte do ano comemorativo de Van Gogh — no 125º aniversário da sua morte — o Van Gogh Museum, em Amsterdã, organizou a exposição Munch: Van Gogh de grande sucesso que une o artista holandês e o norueguês destacando as pouco conhecidas semelhanças entre os dois mestres europeus.
Para quem não vai passar por lá, o Van Gogh Museum nos deu acesso a vários funcionários, incluindo Teio Meedendorp, o principal pesquisador do museu, e Willem Van Gogh, embaixador do museu e sobrinho-bisneto do querido artista. Willem cresceu com os quadros originais de Van Gogh pendurados em casa.
1. Ao contrário do mito popular, Van Gogh vendeu mais de um quadro e não trabalhava com velas no chapéu
Autorizado por Stacy Fahey
Com tantos mitos sobre Van Gogh quanto luzes existentes em uma noite estrelada, seria difícil para o fã ocasional reconhecer as histórias verdadeiras das falsas. Ao contrário dos amarelos da pintura de Van Gogh vários mitos não foram desaparecendo com o tempo.
Meedendorp disse que um dos mitos que equivocadamente perdura é o de Van Gogh só ter vendido um quadro durante toda a sua vida. De acordo com Meedendorp os pesquisadores sabem que Van Gogh na verdade vendeu “várias” pinturas antes da sua morte.
O mito é bem prejudicial porque também alimenta a ideia que Van Gogh foi totalmente rejeitado como artista, que não era o caso. Meedendorp aponta que ele só trabalhou como artista por 10 anos antes do seu suicídio pois “é depois de algum
tempo que você fica famoso e começa a vender”.
O principal pesquisador do museu dedicado ao artista explicou em detalhe: “Seu azar foi ter trabalhado por apenas 10 anos, quando se suicidou. Ele poderia ter vendido mais se tivesse continuado vivo.”
De um lado mais romântico, um mito popular (e igualmente falso) conta que Van Gogh pintava à noite, usando velas acesas acima de seu chapéu para iluminação. “É um mito maravilhoso… adorável mesmo, de certa forma”, disse Meedendorp, antes
de contar a verdade.
Segundo Meedendorp o mito tem origem no jornalista francês Gustave Coquiot, que escreveu um livro sobre Van Gogh em 1922 que incluía a “anedota que [Van Gogh] estaria pintando com uma vela aceso no seu chapéu próximo ao rio na Noite
Estrelada“.
Mas Van Gogh escreveu em sua própria recordação daquele momento que a pintura foi feita “simplesmente com uma lamparina”.
2. Um jovem Van Gogh tentava com certa regularidade entregar flores em vez da lição de casa – que ele frequentemente não terminava
Van Gogh não se interessava muito nas lições talvez um dos detalhes mais narrados da sua vida.
Quando ele estudou teologia em Amsterdã ele também teve aulas de álgebra, latim e grego. De acordo com Meedendorp ele não estava preocupado com essas aulas secundárias, no seu trabalho de padre, e por isso ele deixava essas lições de lado.
Um professor de Van Gogh nessa época contou a história, Meedendorp relembra da pesquisa, na qual ele “era capaz de notar de forma exata [quando Van Gogh vinha na sua direção] se [Van Gogh] tinha ou não feito seus exercícios pois ele trazia algumas flores.” Pobre, Van Gogh roubava flores de um cemitério no seu caminho com a intenção de entregar como lição de casa.
Isso “enfatizava a personalidade suave que Vincent tinha”, disse Meedendorp.
3. Quando Van Gogh sentia que tinha ido mal na escola de teologia, ele se autoflagelava com um pedaço de madeira
Esquerda: 1873. Centro: Vincent van Gogh, “Caveira com Cigarro Aceso” 1885-1886. Direita: Vincent van Gogh, “Autorretrato” 1887 (WIKIMEDIA)
Os ganhadores do prêmio Pulitzer pelo livro Van Gogh: A Vida, Steven W. Naifeh e Gregory, contam em detalhe como Van Gogh se punia fisicamente por razões religiosas. Algumas afirmações do livro incluem Van Gogh saindo em tempestades sem casaco, comendo só pão preto de centeio e dormindo em uma bengala.
Embora o Museu de Van Gogh discorde com uma seção bem divulgada do livro Van Gogh – em particular os capítulos nos quais os autores afirmam que ele não teria cometido suicídio e que teria sido assassinato — Meedendorp falou sobre a
surpreendente capacidade de van Gogh em se automutilar.
Meedendorp disse que “Van Gogh às vezes se feria ou punia se ele não estivesse fazendo as lições” um relato do professor anteriormente citado, em Amsterdã.
4. A vida amorosa de Van Gogh era com frequência complicada, mas quando ele se apaixonou pela dona de um café, mesmo sem um centavo, ele a ganhou dedicando-lhe suas flores, em vez de comprar algo real
Esquerda: Vincent van Gogh, Agostina Segatori Sentada no Café du Tambourin, 1887-1888. Direita: Jean-Baptiste-Camille Corot, Agostina, a italiana, 1886. (WIKIMEDIA)
Willem Van Gogh contou uma história que ele gosta “demais” e trata de um caso amoroso importante do seu tio-bisavô com uma ex-modelo mais velha, dona de um restaurante parisiense chamado Café du Tambourin.
Conforme conta o sobrinho-bisneto, Van Gogh se apaixonou de Agostina Segatori e eventualmente fez seu retrato (visto na pintura acima à esquerda, com Jean-Baptiste-Camille Corot que criou a outra). Mas durante o início da paquera, Van Gogh “queria comprar flores e expressar o seu amor por ela, mas ele não tinha como fazer isso”, disse Willem.
Sem ter que roubar flores de um cemitério local, Van Gogh podia agir através de sua arte. Willem continuou: “Quando ele conheceu Segatori, ele praticava com natureza morta, especialmente flores.” Willem começou a rir e depois disse: “Com cada
buquê de flores pintado ele dizia para Segatori:
‘Este é para você’, em vez de presenteá-la com flores reais. Essa é uma história que eu considero bonita.”
De acordo com a lenda que permeia seus encontros, Van Gogh frequentemente pagava pelas refeições do restaurante com os seus quadros que ele então pendurava na parede. No entanto, este último detalhe pode ser um dos mitos que ainda permanecem.
5. Uma família era “a única coisa que ele realmente queria da vida”. Van Gogh nunca conseguiu isso
WIKIMEDIAVincent van Gogh, “Autorretrato”, 1888.
“A única coisa que ele realmente queria da vida […] era ter uma esposa e filhos e, obviamente, ele nunca conseguiu isso”, disse Meedendorp ao HuffPost.
Segundo Meedendorp, o artista sabia que era “difícil para ele conhecer pessoas” e consequentemente, formar uma família. Entretanto, já que a sua própria família tinha sido tão importante para ele na infância, ele continuou a sonhar com isso.
Ele passou um ano e meio “brincando de família” conforme descreveu Meedendorp, na cidade holandesa de Haia, com a modelo e ex- prostituta, Sien Hoornik, e sua filha. Depois desta relativamente longa relação, no entanto, o relacionamento de Van Gogh com as mulheres “foi mais difícil e curto,” disse Meedendorp.
O artista teve sentimentos contraditórios quando seu irmão, Theo, conseguiu formou uma família. Quando Theo contou que seria pai, Vincent Van Gogh pintou o agora famoso “Amendoeira em Flor” e deu de presente ao casal. Willem Van Gogh
disse ao HuffPost que o seu trabalho, que foi dedicado ao seu avô, é um dos favoritos dos seus descendentes.
(Fonte: brasilpost.com.br)