Têm coisas e pessoas e sentimentos que transbordam. Do resto, pouco ou quase nada entendo. E nem quero entender. Por mais que diga que sim. Sim, tenho o meu lado dissimulado quando finjo para mim mesma que compreendo o medo alheio ou que me escandalizo com as suas ideias insólitas numa mesa de bar.
Sempre senti certo respeito desdenhoso por aquilo que não extrapola, por aquilo que não salta aos olhos. Por aquilo que não agarra a jugular querendo beber até a última gota da alma alheia.
Desprezo abraços frouxos, sentimentos incapazes de gritar, de gemer, de gozar. Desprezo as máscaras bem comportadas de quem não consegue se dar. Muito menos receber. Não há nada mais apequenado do que recusar o gesto louco alheio. Quem não tem senso de humor para tecer as suas redes, ao menos ria da piada feita.
Gosto de pessoas que escutam a música e se põem a dançar. Ou que dançam mesmo sem ouvi-la. Este é o maior ato de fé.
Gosto daqueles que fluem rumo aos outros. Gosto de pessoas despudoradas, que se rasgam em confidências imprudentes, indecentes. Gosto de quem apanha 70 x 7 vezes e ainda mostra o rosto cheio de empáfia.
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Desprezo os que usam as porradas anteriores para justificar a própria covardia, a incapacidade de dançar nu na chuva ao som de uma canção imaginária. Levar na cara e chorar e sorrir ao mesmo tempo, engolindo o sangue juntamente com a esperança de qualquer coisa abstrata é para os fortes.
Não, não entendo as armaduras. Dizer que entendo faz parte do meu teatro barato. Mas diante das minhas paredes internas revestidas por espelhos, onde me ponho nua e desbocada, rio estridentemente, viro quase um demônio, sem nenhuma compaixão por estes zumbis que empacam as ruas da alma, cortando o fluxo dos rios da criatividade. Cortando o fluxo de tudo aquilo que existe de mais genuíno, intenso e medonho.